SAO MARTINHO

Nocturno
 

Lá fóra o luar continua
E o trem divide o Brasil
Como un meridiano

 
Prosperidade
 

O café é o ouro silencioso
De que a geada orvalhada
Arma torrefacções ao sol
Passarinhos assoviam de calor
Eis-nos chegados á grande terra
Dos cruzados agricolas
Que no tempo de Fernão Dias
E da escravidão
Plantaram fazendas como sementes
E fizeram filhos nas senhoras e nas escravas
Eis-nos deante dos campos atavicos
Cheios de gallos e de rezes
Com porteiras e trilhos
Usinas e egrejas
Caçadas e frigorificos
Eleições tribunaes e colonias

 
Paisagem
 

O cafesal é um mar alinhavado
Na afflição humoristica dos passarinhos
Nuvens constroem cidades nos horizontes dos
carreadores
E o fazendeiro olha os seus 800.000 pés coroados

 
Bucolica
 

Agora vamos correr o pomar antigo
Bicos aereos de patos selvagens
Tetas verdes entre folhas
E uma passarinhada nos vaia
Num tamarindo
Que decola para o anil
Arvores sentadas
Quitandas vivas de laranjas maduras
Vespas

 
Escola rural
 

As carteiras são feitas para anõezinhos
De pé ao chão
Ha uma pedra negra
Com syllabas escriptas a giz

A professora está de licença
E monta guarda a um canto numa vara
A bandeira alvi-negra de São Paulo
Enrolada no Brasil

 
Pae negro
 

Cheio de rotulos
Na cara nas muletas
Pedindo duas vezes a mesma esmola
Porque só enxerga uma nuvem de mosquitos

 
Assombraçao
 

6 horas
O Domingos Papudo
E a besta preta
Nadando no vento

 
Lei
 

Depois da creação do municipio novo
Plantado depressa nas ruas de poeira
Os bebés inumeraveis da colonia
Serão registados em Pradopolis

 
Tragedia Passional
 

Hoje acendem velas
Na cruz no matto
E ha uma inscripção
Dizendo que o cadaver da moça
Foi achado nel Rio del’ Onza

 
Morro Azul
 

Passarinhos
Na casa que ainda espera o Imperador
As antenas palmeiras escutam Buenos-Ayres
Pelo telephone sem fios
Pedaços de ceu nos campos
Ladrilhos no ceu
O ar sem veneno
O fazendeiro na rede
E a Torre Eiffel nocturna e sideral

 
O violeiro
 

Vi a sahida da lua
Tive um gosto singulá
Em frente da casa tua
São vortas que o mundo dá

 
 
Matte Chimarao
 

Depois da churrascada
Ao fogo e ao vento
O cavalleiro do gado
Trouxe ouro em pó
E uma cuia festiva
Para sorvermos a digestão

 
A laçada
 

O Bento cahiu como um toro
No terreiro
E o medico veiu de Chevrolet
Trazendo um prognostico
E toda a minha infancia nos olhos

 
Versos de Dona Carrie
 

A neblina nos segue como um convidado
Mas ha um clarão para as bandas de Loreto
Cafezaes
Cidades
Que a Paulista recorta
Corôa colhe e esparrama em safras
A nova poesia anda em Goffredo
Que nos espera de Ford

Numa roupa clara de fazenda
E′ elle quem cuida da plantação
E organiza a serraria como un poema
O team feminino nos bate
Mas Cendrars faz a ultima carambola
Soldado de todas as guerras
Foi elle quem salvou a França na Champagne
E os homens na partida de bilhar daquella noite
Terraço
Rede
Paineiras pelo cco
As estrellas de Gonçalves Dias

 
Metalurgica
 

1.300° á sombra dos telheiros rectos
12.000 cavallos invisiveis pensando
40.000 toneladas de nickel amarello
Para sahir do nivel das aguas esponjosas
E uma estrada de ferro nascendo do solo
Os fornos entroncados
Dão o gusa e a escoria
A refinação planta barras
E là em baixo os operarios
Forjam as primeiras lascas de aço

Esta obra entrou em domínio público pela lei 9610 de 1998, Título III, Art. 41.


Caso seja uma obra publicada pela primeira vez entre 1930 e 1977 certamente não estará em domínio público nos Estados Unidos da América.