PArtido eu com a preſſa que digo deſte rio Parlès, hum Sabado quaſi Sol poſto, cõtinuey por minha derrota atè a terça feyra ao meyo dia, em que prouue a noſſo Senhor que cheguey às ilhas de Pullo Çambilão, primeira terra da coſta do Malayo, onde achey tres naos Portugueſas, duas que vinhaõ de Bengala, & hũa de Pegù, de que era Capitão & ſenhorio hum l Triſtão de Gaa, ayo que fora de dom Lourenço filho do Viſorrey dom Franciſco de Almeida, que Miroocem matou na barra de Chaul, de que as hiſtorias do deſcubrimento da India fazem larga menção. Eſte Triſtão de Gaa me proueo logo de muytas couſas de que vinha falto, como foraõ amarras, & marinheyros, & dous ſoldados, & hum Piloto, & elle com as outras duas naos me deraõ ſempre guarda em todo o caminho, ate ſurgir no porto de Malaca. Onde deſembarcando em terra, me fuy logo á fortaleza ver o Capitão, & lhe dey conta de tudo o que ſocedera na viagem, & lhe tratey miudamente do deſcubrimento dos rios, portos, & angras que nouamente achara na ilha Çamatra, aſsi da parte do mar Mediterraneo, como do Oceano, & dacommutação do trato da gente que nelles habitaua, que aré então não tiuera com noſco nenhum comercio. E toda eſta coſta, & portos, & rios trouxe por graduação arrumados em ſuas alturas, com ſeus nomes, & medição dos fundos, cõforme ao regimento que leuaua. E tambẽ trouxe informacão da bahia onde ſe perdera o Roſado Capitão da nao Frãceſa, & Matalote do Brigas Capitão da outra nao, que por caſo de tempo eſgarraõ foy ter a Diu no anuo de 1529. ſendo ainda viuo Soltão Baudur Rey de Cambaya, que a todos os Franceses della fez Mouros, que eraõ oitenta & dous, os quais deſpois ſendo Elches, leuou no anno de 1533. por bombardeiros, na guerra que teue co Rev dos Mogores, onde todos morreraõ, ſem hum ſó ficar viuo. E tambem o informey do ſurgidouro da bahia de Pullo Botum, onde antigamente eſtiuera a nao Biſcainha, q̃ dizião que fora do Magalhaẽs, que deſpois ſe perdeo no boqueyraõ da çunda, querendo atraueſſar a ilha da laoa. Deylhe tãbem conta das muytas & varias naçoẽs de gentes que habitão ao longo daquelle Oceano, & do rio Lampom, donde o ouro de Menancabo vay ter ao reyno de Cãpar pelos rios de Iambee & Broteo, no qual os naturaes deſta terra affirmão, pelo que lem nas ſuas Chronicas
, que eſtiuera hũa caſa de contrato da Raynha Sabà, donde algũs preſumẽ que hum ſeu feitor por nome Nauſem lhe mandara hũa grande ſoma de ouro, que ella deſpois leuou para o templo de Ieruſalem, quando foy ver a el Rey Salamão, donde dizem que veyo prenhe de hum filho, que deſpois ſoccedeo por Emperador da Ethiopia, a que cà o vulgar chama Preſte Ioaõ, & de que eſta naçaõ Abexim ſe honra muyto. Tambem o informey da peſcaria do aljofre, que eſtá entre Pullo Tiquòs, & Pullo Quenim, donde os Batas o leuauão antigamente a Pacem, & Peedir, que os Turcos do eſtrerto de Meca, & as naos de Iudaa ahy lhes comprauão a troco de outras mercadorias que trazião do Cayro, & dos portos de toda a Arabia Feſix. E aſsi mais lhe dey relação de outras muytas couſas que ſoube do Rey dos Batas, & de mercadores da cidade de Panaajù. E lhe trouxe tambem por eſcrito a informaçaõ da ilha do ouro, que me elle muyto encomendara, a qual, ſegundo todos dizem, jaz ao mar deſte rio de Calandor em cinco graos da parte do Sul, cercada de muytos baixos, & de grandes correntes, & que pode diſtar deſta ponta da ilha Çamatra, atè cento & ſeſſenta legoas pouco mais ou menos. E deſta informação, de que Pero de Faria foy certificado, afsi pelo que lhe eu diffe, como pelo que o Rey dos Batas lhe eſcreueo por mim, deu aquelle anno conta a el Rey dom Ioaõ o terceyro que ſanta gloria aja: o qual logo no outro anno ſeguinte proueo na capitania do descobrimento della a hum Franciſco Dalmeida, caualeyro de ſua caſa, homem de muytas partes, & bem ſufficiente para aquelle cargo, & que ja de muytos dias o pedia, em ſatisfaçaõ de rnuytos ſeruiços q̃ tinha ſeytos nas ilhas de Banda, Maluco, Ternate, & Geilolo, o qual Franciſco Dalmeida indo da India para lâ falleceo de febres nas ilhas de Nicubar. E ſendo ſua alteza certificado da ſua morte, proueo ſegunda vez na meſma capitania a hum Diogo Cabral da ilha da Madeyra, a quem Martim Afonſo de Souſa a tirou por juſtiça, por ſe dizer que praguejara delle ſendo Gouernador, & a deu a hum Ieronymo de Figueiredo fidalgo do Duque de Bargança, que no anno de 1542. partio de Goa com duas fuſtas, & hũa carauella em que leuaua oitẽta ſoldados & oſficiaes da marcacão, & não teue effeito a ſua yda, porque parece, ſegnndo o que deſpois ſe vio, que deſejando elle de ſer rico mais depreſſa do que o eſperaua ſer pela via que leuaua, ſe paſſou à coſta de Tanauçarim, onde tomou algũas naos que vinhaõ do eſtreito de Meca, de Adẽ, de Alcoſſer, de Iudaa, & de outros lugares da coſta da Perſia, & por ſe là dar mal cos ſoldados, & não partir com elles do que tomara, conforme ao quede direito lhes vinha, ſe leuãtaraõ contra elle, & depois de outras muytas couſas, que me pareceo razão naõ ſe eſcreuerem, o araraõ de pes & de maõs, & o leuarão à ilha
Ceilão, onde o lançaraõ em terra no porto de Gàle, & a carauella & fuſtas leuaraõ ao Gouernador dom Ioaõ de Caſtro, que lhes deu perdão do q̃ tinhão feito, por irem d’armada com elle a Diu a ſocorro de dõ Ioaõ Maſcarenhas, que então eſtaua cercado dos Capitaẽs del Rey de Cambaya, & de então pera cà ſe não tratou mais deſte descobrimento, que tão proueitoſo parece que ſerà para o bẽ commum deſtes reynos, ſe noſſo Senhor foſſe ſeruido que eſta ilha ſe vieſſe a deſcobrir.