Poesias offerecidas ás senhoras Portuenses/A Tempestade

A Tempestade.
 

Que quadro tão horrivel, magestoso,
A natureza off'rece n'este dia !
Do mar, que brame irado, enfurecido,
Fogem immensas áves 'spavoridas!
Sopram os aquilões enraivecidos,
Arvores derrubando agigantadas!
E já da terra o pó erguendo aos ares
Por instantes se eclipsa o firmamento:
Negras nuvens o claro sól offuscam,
De trevas já cubrindo a natureza,
Allumiada só de quando em quando,
Pela luz desbotáda do relamp'go:

Cada vez o trovão mais perto troa;
Aproxima-se o raio estragador;
Já arde ao camponez da choça o colmo,
Que a faisca terrivel lhe arruinou :
Das montanhas lá descem os rebanhos,
Que a tempestade poz em confusão,
Malando-lhe os novilhos pequeninos,
Com a chuva de pedra estrepitosa :
Na Igreja a torre antiga, e veneranda,
Céde à força do raio, e cae em terra:
Lá se avista no mar desmastreado,
Ao ludibrio das vagas um navio,
E adiante em jangada mal segura,
Luctando com o mar embravecido,
Por salvar-se trabalham infelizes,
Vendo junto de si o abysmo, a morte!
D'aquí, e d'acolá brados se escutam,
Horrores só se veem, estragos, morte!
Parece que na terra hoje passou.
Do exterminio esse anjo despiedado,
Que em seu trilho só deixa pranto, e dor!!