126. O REY LEIR

Quando foi morto rey Balduc o voador reynou seu filho que ouve nome Leyr. E este rey Leyr nom ouve filho, mas ouve tres filhas muy fermosas e amavaas muito. E huum dia ouve sas razoões com ellas e disselhes — Que lhe dissessem verdade quall dellas o amava mais. Disse a mayor — Que nom avia cousa no mundo que tanto amasse como elle. E disse a outra — Que o amava tanto como ssy meesma. E disse a terçeira, que era a meor — Que o amava tanto como déve d'amar filha a padre.

E elle quislhe mall por em, e por esto nom lhe quis dar parte no reyno. E casou a filha mayor com o duque de Cornoalha, e casou a outra com rey de Testia; e nom curou da meor. Mas ella por sa ventuira casousse melhor que nenhuma das outras, ca se pagou della elrrey de França e filhoua por molher. E depois seu padre della em sa velhiçe filharomlhe seus gemrros a terra e foy malladamte, e ouve a tornar aa merçee delrey de França e de sa filha a meor a que nom quiz dar parte do rreyno. E elles reçeberomno muy bem e deromlhe todas as cousas que lhe forom mester e honrraromno mentre foy uiuo; e morreu em seu poder. E depois se combateo elrrey de França com ambos os cunhados de ssa molher e tolheolhes as terras.

(Port. Mon. historica (Scriptores), Livros de Linhagens, p. 238.)



126. O rey Leir. — A tradição do rei Lear acha-se na Chronica bretã de Geoffroy de Montmouth, e no Roman de Brut, de Robert Wace. Gubernatis acha nas lendas indianas de Dirghatamas e Yayati, do Mahabaratha, «um primeiro esboço do rei Lear.» (Myth. zoolog., t. I, p. 93.) A lenda está hoje universalisada na tragedia de Shakespeare. Sob o n.º 50 vem uma versão oral.