A Pele do Urso
Dois caçadores precisados de dinheiro tiveram a idéia de vender a pele de um urso que morava na floresta proxima. Feito o negocio e recebida a importancia, tomaram das espingardas e sairam em procura da féra. Encontraram-lhe sem demora o rasto e seguiram-no cautelosos. Subito, um deles, batendo na testa, exclamou:
— Que caçadores das duzias somos nós! Pois não é que deixamos em casa os cartuchos?
Era verdade aquilo, e mal os caçadores deram pela coisa o mato estaleja e o urso aparece.
Rapido como o relampago, um deles consegue trepar por uma arvore acima. Já o outro, mais lerdo, o remedio que teve foi deitar-se no chão e fingir-se de morto.
O urso chegou, bamboleando o corpo. Dá com o “cadaver”, fareja-o nos olhos, no nariz, nos ouvidos e exclama:
— Carniça! Isto é coisa que só aos urubús pode interessar. E retirou-se, bamboleante.
Assim que o urso desapareceu ao longe, os caçadores, até então imoveis, respiraram e criaram alma nova. E, muito satisfeitos de se verem livres das unhas da “pele” vendida, foram correndo para casa. Lá chegados, riram-se da aventura; e o que trepara á arvore perguntou ao que se fingira de morto:
— Que é que te disse o urso ao ouvido, compadre?
— Disse-me que não se deve contar com o ovo antes da galinha o botar!...
Ouvindo falar em ovo, tia Nastacia veio lá da cosinha saber que historia de ovo era aquela. Ovo é uma coisa que bole no coração das cosinheiras. Dona Benta teve de repetir o caso da pele do urso.
A pobre preta não entendeu nada. Só gostou daquele ovo ali no fim, mas não achou nenhuma relação entre a pele do urso e o ovo de galinha.
— Será que esse caçador pensa que urso bota ovo? disse ela tolamente.
Todos riram-se.
— A cara de tia Nastacia está me sugerindo uma fabula que esqueci de contar, disse dona Benta — a do Galo e a Perola. Um galo estava ciscando no terreiro. De repente encontrou uma perola. “Que pena!” exclamou. “Antes fosse um grão de milho”.
A boa negra ainda ficou mais atrapalhada. Urso, ovo de galinha, perola, grão de milho... Que embrulhada era aquela? E voltou para a cosinha resmungando:
— Até sinhá está ficando que a gente não entende. Crédo...
Esta obra entrou em domínio público pela lei 9610 de 1998, Título III, Art. 41.
Caso seja uma obra publicada pela primeira vez entre 1929 e 1977 certamente não estará em domínio público nos Estados Unidos da América.