FUTURISMO (movimento artístico italiano) → Vanguarda
"O sofrimento de um homem não é para nós mais interessante
de que o sofrimento de uma lâmpada atingida pelo curto-circuito"
(Marinetti)
O poeta italiano Filippo Tommaso Marinetti, publicando em 1909, no jornal "Le Figaro" de Paris, o "Manifesto Futurista", dava origem às várias correntes artístico-literárias, chamadas de Vanguarda. A proposta essencial era a destruição de todas as formas tradicionais de cultura, a serem substituídas por uma arte mais condizente com a era da máquina. O vanguardismo deveria atingir não apenas a literatura, mas também a pintura, a escultura, a arquitetura, a música, além de tentar verter implicitamente as instituições políticas, sociais e religiosas, propondo novas ideologias. A este primeiro manifesto seguiram-se outros, de Marinetti e de seus seguidores, tendo como nota comum o antipassadismo e a revolta contra o academicismo pedante e medíocre. No que toca mais especificamente a Literatura, assinalamos: "Manifesto técnico da literatura futurista" (Marinetti, 1912); "Uma bofetada ao gosto do público" (Maiakóvski e outros escritores russos, 1912); "Manifesto do Futurismo inglês" (Marinetti e Nevinson, 1914); "Lacerba" e "A voz", as duas principais revistas da Vanguarda italiana, que tiveram a colaboração de escritores famosos como Giovanni Papini e Giuseppe Ungaretti. Para as outras artes, eis uma súmula dos princípios estéticos apregoados pelo Futurismo:
Pintura: Manifesto de Carrà, 1913: "A pintura dos sons, dos ruídos e dos odores".
Carrà, Soffici, Severini, Russolo, Balla e outros pintores futuristas tentaram retratar a velocidade, o dinamismo e a mudança rápida da vida moderna com cores berrantes (vermelho, verde, amarelo, laranja) espalhadas em composições chocantes, traduzindo o princípio estético da sinestesia e da simultaneidade dos estados da alma na obra de arte. Deixando-se guiar apenas pela intuição, transpuseram para o quadro, através de imagens desconcertantes, temas do inconsciente, do sonho, da alucinação. Quanto ao foco visual, os pintores futuristas pretendiam fazer com que o espectador ficasse no centro da obra, na medida em que esta transmite uma síntese de tudo aquilo que ele lembra, vê e sente. Quanto ao material usado, inventaram a técnica da colagem, utilizando pedaços de jornais, revistas, cartazes de publicidade e partituras musicais, com a intenção de mostrar o dinamismo das informações consumidas pelo homem moderno.
Escultura: Manifesto técnico da escultura futurista (Boccioni, 1912)
Boccioni pretendia fazer "viver os objetos", aplicando linhas de força: o conceito de "forma-força" passou a substituir a "forma-linha" dos neoclássicos, a "forma-cor" dos românticos e a "forma-luz" dos impressionistas. Também na escultura se usaram materiais heterogêneos, inventando-se a arte "polimatérica": madeira, papelão, lata, cobre, junto com a pedra e o mármore.
Arquitetura: Manifesto dos arquitetos (Sant’Elia, 1914)
Para a arquitetura foram tentadas experiências idênticas às da pintura e da escultura.
Teatro: Manifesto do teatro sintético (Marinetti, 1915)
A dramaturgia futurista tentava representar a rapidez do mundo das máquinas pela cenografia múltipla; pela simultaneidade das ações; pelo envolvimento do espectador. Tal síntese fazia com que a peça tradicional se tornasse apenas um sketch, algo de anedótico. Um bom exemplo é uma "tragédia", intutulada A detonação, de Francesco Gangiullo: no cenário vê-se uma rua escura e deserta; durante um minuto reina um silêncio mortal; de repente, ouve-se um tiro de revólver; e cai o pano. O teatro sintético futurista, em si sem muito sucesso, influenciou as peças vanguardistas de Alfred Jarry, Eugêne Ionesco, Apollinaire e Maiakóvski.
Música: Manifesto dos músicos, 1911, e Arte dos ruídos, 1913.
Marinetti imaginava orquestras inteiras constituídas por instrumentos ruidosos e acionadas por eletricidade. Luigi Russolo, pintor e músico, inventou e patenteou um colossal engenho produtor de ruídos, chamado "intonarumore". Num concerto futurista, havido em Milão em 1914, a orquestra era composta por explodidores, sirenistas, roncadores, gargarejadores. Pelo gosto do barulho, os futuristas foram apelidados de "rumoristas". Segundo alguns especialistas, a música concreta e a música eletrônica dos nossos dias seriam extensões do movimento futurista.
Fazendo um balanço das contribuições do Futurismo, podemos salientar aspectos positivos (atmosfera de libertação artística, de anticonvencionalismo e de rebeldia que alimentaria a arte contemporânea) e negativos (fazer "tábula rasa" do passado, destruir a tradição cultural, levar o anti-humanismo até o anti-humanitarismo pela exaltação da guerra, considerada a "higiene do mundo", da juventude, da virilidade, do prazer da destruição). Neste sentido, o Futurismo insere-se na corrente de pensamento que vai de Nietzsche (a quem foi atribuída a concepção da raça pura, do super-homem e da super-nação) ao Nazismo (→ Hitler). Aliás, a relação do Futurismo com o Fascismo é muito forte. Foram os comícios futuristas que levaram à intervenção italiana na Primeira Guerra Mundial, para a defesa dos "povos poéticos" (a expressão é de Marinetti), que seriam os franceses, italianos, russos, ingleses e japoneses, contra os "críticos pedantes" (alemães e austríacos). Mussolini, então socialista e futurista, tornou-se também intervencionista. No contexto político, o Futurismo pode ser interpretado como expressão da ambição nacional italiana no início do século XX: a Itália, recém-unificada, desejava impor-se ao mundo, não apenas pelo seu passado arqueológico, mas pelo dinamismo econômico e militar. Não foi por acaso que os grandes centros de desenvolvimento industrial e comercial (Milão e Turim) transformaram-se também nos maiores focos da arte futurista.