IFIGÊNIA (a vítima da crueldade paterna e da vingança divina) → Agamenão
Vestida de branco, a jovem é levada para o altar,
não para casar, mas para morrer
O mito de Ifigênia é um dos mais comoventes. Filha do rei de Micenas, é obrigada a sofrer por uma culpa de seu pai: Agamenão, conforme uma lenda, provocara a ira de Diana, afirmando ser tão bom caçador quanto a deusa. Esta, então, por vingança, pediu ao deus Éolo que parasse todos os ventos no porto de Áulis, paralisando os navios gregos chefiados por Agamenão e prontos a zarparem para a guerra de Tróia. O adivinho Calcante explicou que Diana só seria apaziguada se Agamenão sacrificasse sua filha Ifigênia. O rei, então, mandou buscar a jovem em Micenas, com o pretexto de dá-la em casamento ao herói Aquiles. Mas, no momento da imolação, como aconteceu no episódio bíblico do sacrifício de Isaac por Abraão, Diana apiedou-se da jovem vítima e mandou que fosse substituída por uma cabrita. Esta passagem encontra-se descrita de uma forma lírica estupenda pelo poeta latino Lucrécio, na sua obra De Rerum Natura (Sobre a natureza das coisas), onde observa que o pai, em lugar de levar ao altar a jovem, vestida de branco, para o casamento que gera a vida, entrega a filha no altar da morte. E termina a narração do episódio com o seguinte comentário: "até que ponto a religião pode induzir o homem a cometer crimes"! De Áulis, Ifigênia vai para a Táurida (atual Ucrânia), tornando-se sacerdotisa da deusa Diana, encarregada de sacrificar os estrangeiros. Descobrindo que um dos forasteiros lá chegados era seu irmão Orestes que, com o amigo Pílades, buscava a estátua de Diana Táurida, ela foge com eles. Em Micenas, obtido o perdão de Diana pela intervenção da deusa Atena, Ifigênia se casa com Pílades. O mito de Ifigênia encontra-se tratado artisticamente em duas tragédias de Eurípides: Ifigênia em Áulis (405 a.C.) e Ifigênia em Táurida (412) e lembrado em outras obras de vários escritores greco-romanos. No Neoclassicismo francês, sobressai a tragédia de Racine Ifigênia em Áulis. Na época do Romantismo, o mito é retomado pelo poeta alemão Goethe: Ifigênia em Táurida (1787). Na segunda metade do séc XVIII, a lenda de Ifigênia invade o mundo da Ópera. Os libretistas proporcionaram ao compositor Gluck duas notáveis obras de arte lírica: Iphigènie en Aulide (1774) e Iphigènie en Tauride (1779). Enfim, a personagem mítica de Ifigênia passou à história como símbolo da inocência sacrificada, do ser humano doce e generoso, vítima do hieratismo paterno e da vingança dos deuses.