O Tao[1] que se pode discursar
Não é o eterno Tao.
O Nome que pode ser nomeado
Não é o eterno Nome.
O Não-ser
É o nome da origem do céu e da terra.
O Ser
Nomeia a mãe das dez-mil-coisas[2].
Por isto:
No Não-ser
Contempla-se o deslumbramento.
No Ser
Contempla-se sua delimitação.
Ambos, o mesmo, com nomes diversos
O mesmo diz-se mistério.
Mistério dos mistérios
Portal de todo deslumbramento.
Notas
editar- ↑ Tao 道(pronuncia-se tao, mas na grafia chinesa Pinyin escreve-se Dao) pode ser traduzido literalmente como curso ou caminho. Esta obra optou por manter a palavra original, que constitui-se da combinação dos símbolos de "cabeça" e "andar" (há uma segunda palavra para caminho em chinês Lu constituida de "pé" e "cada") , evitando a tradução que iria descaracterizar a abordagem do autor. O termo não é uma criação de Lao Tzu, mas já era de uso corrente em diversas escolas religiosas e filosóficas chinesas como caminho de como realizar algo (possivelmente sua origem esteja associada às trajetórias astronômicas), porém a necessidade de determinar este absoluto incompreensível fez com que o autor expandisse o significado da palavra para um conceito sem limites (o que implica também o abandono de uma abordagem teológica do conceito como pretendem muitos autores ocidentais).
- ↑ Tradicionalmente considera-se que "dez mil coisas" tem o mesmo significado de miríade ou infinito número de coisas.
Sob o céu:
Quando reconhecemos o que faz o belo ser belo
Surge o feio!
Quando reconhecemos o que faz o bem ser bom
Surge o mal!
Por isto:
O Ser e o Não-ser
Surgem mutuamente;
O fácil e o difícil
Complementam-se;
O longo e o curto
Condizem;
O alto e o baixo
Convivem entre si;
O som e a voz
Casam-se;
O antes e o depois
Seguem-se.
Por isto:
O homem santo cumpre suas ações sem agir,
Pratica o ensino sem falar,
E as dez-mil-coisas agem sem serem impedidas.
Ele cria e nada possui,
Atua e não nada guarda,
Realizada a obra ele não se apega.
E justamente por não se apegar
Ela não se esvai.
Se não privilegiarmos os bons, o povo não compete;
Se não valorizarmos os bens custosos, o povo não rouba;
Se não exibirmos coisas desejáveis, o coração do povo não erra.
Por isso o governo do homem santo:
Esvazia os corações e sacia as entranhas;
Enfraquece as vontades e revigora os ossos;
Nunca deixa o povo ter conhecimento e desejos;
Para o douto não ousar agir.
Agindo o não-agir então não há desgoverno.
O Tao é um vaso vazio
Cujo uso nunca transborda.
Abismo!
Parece o ancestral das dez-mil-coisas!
Abranda o cume;
Desfaz o emaranhado;
Modera o brilho;
Une o pó.
Profundo!
Parece existir algo!
Eu não sei de quem ele é filho
Parece ser o anterior ao Ancestral.
O Céu e a Terra não têm amor humano;
Consideram as dez-mil-coisas como cães de palha[1]
O homem santo não possui amor humano;
Considera as dez-mil-coisas como cães de palha.
O espaço entre o céu e a terra é como um fole!
Esvazia sem contrair-se, ao soprar-se mais sons produz.
Mas muitas palavras e números o esgotam
Melhor guardar o que está no íntimo.
Notas
editar- ↑ Cão de palha (no chinês simplificado 刍狗; no chinês tradicional 芻狗 e no pinyin chú gǒu) é a figura de um cachorro feito de palha, utilizada como objeto cerimonial na China antiga, mas frequentemente jogada fora após o uso. Su Zhe faz o seguinte comentário sobre este trecho: "O céu e a terra não são parciais. Eles não matam os seres vivos por crueldade ou dão-lhes nascimento por bondade. Fazemos o mesmo quando construímos cães de palha para usar em sacrifícios. Nós os vestimos, levantamos e colocamos no altar, mas não porque os amamos. E quando a cerimônia termina, jogamos-os na rua, mas não porque os odiamos."
O espírito do vale nunca morre
Ele chamado de mulher misteriosa.
O portal da mulher misteriosa
É a raiz do céu e da terra.
Initerrupta e perpétua
Parece lá existir
Contudo age sem esforço.
O céu é eterno e a terra duradoura:
O céu e terra são eternos e duradouros
Por não viverem para si mesmos
Isto lhes faz durarem eternamente.
Por isto o homem santo:
Ficando atrás, aparece em primeiro;
Ficando fora, persiste.
Não é por ter nada seu
Que poderá realizar o que é seu ?
O bem supremo é como a água.
Água:
Beneficia às dez-mil-coisas sem conflito
Habita os lugares que os homens abominam
Por isto aproxima-se do Tao.
Para a moradia : bom é onde morar.
Para o coração : bom é a profundidade.
Para a doação : bom é o amor.
Para o falar : bom é a sinceridade.
Para o governo : bom é a ordem.
Para o trabalho : bom é a competência.
Para o movimento: bom é a ação.
Eis que se não existe disputa não existe oposição.
Manter transbordando, melhor parar.
Manter afiando, não vai durar.
Uma sala cheia de ouro e jade, não se pode guardar.
Ser rico e famoso, e ainda arrogante, por si só leva ao danar.
Ao concluir a obra deve-se afastar-se
Este é o Tao do céu.
Conseguir:
Unir a alma e o espírito em uma unidade inseparável;
Ter o sopro maleável de uma criança;
Polir a visão interior até torná-la sem mácula;
Amar os homens e reger o estado sem-agir;
No abrir e fechar da porta do céu, ser como a fêmea de um pássaro;
Penetrar nos quatro quadrantes sem saber.
Gerar e criar;
Gerar e não possuir;
Agir sem depender;
Presidir e não controlar.
Eis a vida secreta.
Trinta raios cercam o eixo;
A utilidade do carro está no seu vazio.
O jarro é feito de barro moldado;
A utilidade do jarro está no seu vazio.
Fazem-se portas e janelas para a casa;
A utilidade da casa está no seu vazio.
Portanto:
O ser serve para ser possuído;
E o não-ser para ser utilizado.
As cinco cores cegam à visão do homem;
Os cinco tons ensurdecem à audição do homem;
os cinco sabores embotam ao paladar do homem;
Galopar e caçar aceleram ao coração do homem;
Bens custoso atrapalham às ações do homem.
Por isto o homem santo:
Atendendo ao interior e não à visão;
Afasta uma coisa e adota outra.
Honra e desonra são como cavalos em fuga:
Causam grandes aflições ao corpo.
Mas por que se diz :
Honra e desonra são como cavalos em fuga ?
A honra eleva;
A desonra derruba;
Ganhar esta ou perder aquela é assustador.
Por isto que se diz:
Honra e desonra são como cavalos em fuga.
Mas por que se diz:
Causam grandes aflições ao corpo?
Por ter um corpo que tenho grandes aflições:
Mas sem corpo que aflições teria eu ?
Portanto:
Quem honra ao mundo como o seu corpo;
A este pode-se confiar o mundo.
Quem ama ao mundo como o seu corpo;
A este pode-se entregar o mundo.
Olhamos e não vemos: o nome soa semente.
Escutamos e não ouvimos: o nome soa sutil.
Tocamos e não sentimos: o nome soa pequeno.
Estes três não podem ser decompostos:
Entrelaçados constituem um.
Seu alto não é luminoso;
Seu baixo não é escuro;
Contínuo...não se pode nomear;
Retorna ao não-ser.
Isto é chamado: forma sem-forma;
Imagem da não-coisa;
Isto é chamado: claro-escuro;
Ao encontrá-lo não se vê rosto;
Ao segui-lo não se vê as costas.
Voltando ao caminho antigo
Poderemos reger o presente
E conhecer a origem da antiguidade.
Isto é: o fio condutor do Tao.
Na Antiguidade os que atuavam pelo Tao
Estavam sutilmente penetrados no místico
Tão profundamente que eram irreconhecíveis
E por serem irreconhecíveis força-se a descrever seu aspecto exterior.
Cautelosos! Como quem cruza águas no inverno!
Vacilantes! Como quem teme vizinhos dos quatro lados!
Reverentes! Como hóspedes!
Evanescentes! Como o gelo que derrete!
Genuínos! Como a lenha não trabalhada!
Abertos! Como o vale !
Opacos! Como a água escura!
Quem pode, no repouso, clarear pouco a pouco o escuro ?
Quem pode, no movimento, produzir pouco a pouco a paz ?
Quem guarda o Tao não deseja o muito
E por não buscar o muito pode renovar-se.
Atingindo o vazio absoluto;
Conservando-se firme no repouso;
As dez-mil-coisas fluem.
E eu as contemplo no refluxo:
As coisas florescem
E retornam todas à raiz.
O retorno à raiz soa: repouso;
Isto é chamado retorno ao destino.
O retorno ao destino soa: eternidade
Conhecer a eternidade soa: iluminação.
Não conhecer a eternidade é o erro que traz o azar
Conhecer a eternidade é ser abrangente.
Ao conhecer a eternidade, há justiça
Ao haver justiça há mediação.
Ao haver mediação, há o céu;
Ao haver o céu, há o Tao;
Ao haver o Tao há duração.
Dissolvendo-se o corpo não há perigo.
A alta antiguidade desconhecia regentes:
Tempos depois os regentes foram amados e louvados;
Tempos depois os regentes foram temidos;
Tempos depois os regentes são desprezados...
Estes não merecem fé.
Pensativos!
Aqueles sim ponderavam as palavras;
E concluindo a obra as coisas seguiam sua natureza;
E as cem famílias diziam:
"Por nós, somos o que somos".
Quando o grande Tao se retrai
Surgem o amor humano e a justiça.
Quando a sabedoria e a crítica prosperam
Surgem as grandes mentiras.
Quando os laços familiares se rompem
Surgem o dever filial e paternal.
Quando as nações estão em desordem
Surgem os funcionários leais.
Quando se diz não à santidade e fora ao saber
O povo é favorecido cem vezes mais.
Quando se diz não ao amor humano e fora à justiça
O povo volta a ser filial e paternal.
Quando se diz não à habilidade e fora ao lucro
Não há roubos não há assaltos.
Se, nestas três sentenças, só existir aparência
Aparência não será, por si só, suficiente.
Por isto deve-se seguir esta regência:
Mostrar-se como a seda;
Abraçar a simplicidade;
Diminuir os interesses;
Dissolver as paixões.
Quando se diz "não" ao estudo vai-se a inquietação.
Entre um sim e um não qual a distinção ?
Quando bem e mal se diferenciam ?
O que os homens temem não pode-se não temer ?
Estéril! Esse nem sim nem não!
O povo está radiante
Como na alegria da festa sagrada
Como no subir nos altos na primavera...
E só eu, hesitante, não recebi sinais auspiciosos;
Como um recém-nascido que não sabe brincar;
Uma marionete sem saber para onde voltar.
O povo tem o supérfluo;
E só eu sou como esquecido.
Eu, com um coração idiota;
Confuso e obscuro.
As pessoas são brilhantes;
E só eu sou ofuscado e tolo.
As pessoas são vibrantes;
E só eu sou melancólico.
Irrequieto como o mar
Rodopiando como o vento sem lugar.
O povo tem suas metas
E só eu sou teimoso e tosco.
Mas só eu sou diferente dos outros
Pois honro a Mãe nutriente.
O conteúdo da grande virtude
Provém inteiramente do Tao.
O Tao gera todas as coisas
De modo tão ofuscante que obscurece.
Obscuras e ofuscantes são suas imagens.
Ofuscantes e obscuras, nele estão as coisas.
Tenebrosa e insondável, nele está a semente.
E esta semente é a verdade
E no seu interior está a autenticidade.
Da antiguidade até hoje
Temos de usar nomes
Para examinar todas as coisas.
Mas como sei como surgem todas as coisas ?
Justamente por sua semente.
Ao curvar-se, fica-se inteiro;
ao torcer-se, fica-se reto;
ao esvaziar-se, fica-se cheio;
ao envelhecer, fica-se novo.
Quando se tem pouco, obtêm-se;
quando se tem demais, perturba-se.
Desta forma:
O homem santo abraça a unidade
e torna-se modelo debaixo do céu.
Não se exibindo, brilha;
não se afirmando, aparece;
não se vangloriando, obra;
não se enaltecendo, perdura.
Não disputa;
logo ninguém sob o céu pode com ele disputar.
A palavra antiga: ao curvar-se, fica-se inteiro;
não é uma palavra vazia,
em verdade, está nela a unidade.
Falar pouco é o natural.
Um ciclone não dura uma manhã inteira;
Um temporal não dura um dia inteiro.
Quem os produz ?
Céu e terra.
Mas se as coisas do céu e da terra não duram;
Quanto mais devem durar as coisas humanas.
Portanto:
Quem segue o Tao é um com o Tao;
Quem segue a Virtude é um com a Virtude;
Quem segue a Perdição é um com a Perdição.
Quem se une ao Tao
O Tao o acolhe alegremente.
Quem se une à virtude
A virtude o acolhe alegremente.
Quem se une à perdição
A perdição o acolhe alegremente.
Onde há pouca fé
Não se encontra fé.
Colocar-se na ponta dos pés
Não se obtém firmeza.
Com as pernas abertas
Não se pode andar.
Quem aparece
Não pode brilhar.
Quem se afirma
Não pode figurar.
Quem se gloria
Não terá méritos.
Quem se enaltece
Não pode perdurar.
Para o Tao ele soará:
Supérfluo.
Parasita.
Coisas que todos abominam.
Por isto, quem está no Tao
Nelas não cai.
Há uma coisa indefinida, mas perfeita,
Que existe antes do Céu e da Terra.
Silenciosa e separada
Fica sozinha e imutável
Tudo permeia, mas nada põe em risco.
Pode ser chamada de Mãe sob o céu.
Não sei seu nome:
Escrevo Tao.
Forçado a nomear:
Chamo de Grande.
Grande significa além;
Além significa longe;
Longe significa retorno.
Por isto:
O Tao é grande;
O Céu é grande;
A Terra é grande;
O Homem é grande.
No Universo há quatro grandes:
O Homem é um dos quatro.
O Homem segue a terra;
A Terra segue o céu;
O Céu segue o Tao;
O Tao segue a si mesmo.
O pesado é a raiz do que é leve;
O repouso é o senhor da agitação.
Por isto o homem santo:
Em viagem não larga o peso de sua bagagem;
É solitário e calmo mesmo com visões gloriosas.
Mas o senhor de dez mil carros
Por eles desprezará seu Império ?
Pela pressa perde-se a raiz;
Pela agitação perde-se a soberania.
Quem bem caminha não deixa rastros.
Quem bem fala não necessita desmentir.
Quem bem calcula não usa ábaco.
Quem bem fecha não precisa de trancas;
E ninguém abre o fechado.
Quem bem liga não usa cordas;
E nada se solta.
Por isto o homem santo:
Sabe bem como salvar homens:
Não há homens rejeitados.
Sabe bem como salvar coisas:
Não há coisas rejeitadas.
Isto é chamado: entrar na lucidez.
Portanto:
O homem bom é modelo para o não-bom.
O homem não-bom é o incentivo para o bom.
Mas se não reconhecemos o modelo;
Nem cuidamos do incentivo;
Haverá erro mesmo que com acúmulo de conhecimento.
Isto é chamado: grande segredo.
Quem conhece o masculino;
E preserva o feminino;
É o abismo do mundo.
Sendo o abismo do mundo;
A virtude eterna não escorre para fora;
E ele volta a ser um recém-nascido.
Quem conhece o claro;
E preserva o escuro;
É o modelo do mundo.
Sendo o modelo do mundo;
A virtude eterna não escorre para fora;
E ele retorna à unidade.
Quem conhece a honra;
E preserva a vergonha;
É o vale do mundo.
Sendo o vale do mundo;
A virtude eterna é o bastante;
E ele retorna à simplicidade.
Se a simplicidade é decomposta
Compõem-se as funções.
O homem santo usa-a;
E torna-se mestre dos funcionários.
Portanto:
O grande governo não necessita de Cortes.
Querer abarcar e manipular o mundo:
Eu vejo que não é possível.
O mundo é uma coisa espiritual;
É impossível manipular.
O manipulador iria arruiná-lo;
O abarcador iria perdê-lo.
Pois as coisas :
Ora precedem, ora seguem;
Ora se acalmam , ora se enfurecem;
Ora se fortalecem, ora fraquejam;
Ora ascendem, ora descendem.
Por isto o homem santo evita :
O excessivo.
O desmedido.
O desqualificado.
Quem ajuda o soberano através do Tao
Nâo viola o mundo com armas:
Porque tal ação sempre leva a uma reação.
Onde acampam exércitos crescem espinhos;
Sempre após combates seguem anos de miséria.
Boa é apenas a decisão e nada mais que isto !
Não há ousadia de conquistar pela violência !
Decisão sem auto-glorificação;
Decisão sem repressão;
Decisão sem orgulho;
Decisão devido a ser único modo de atuação;
Decisão sem violência.
Coisas que necessitam de reforço constante;
Logo envelhecem;
Isto é chamado: sem Tao.
Sem Tao logo não há Tao atuante.
Armas não são instrumentos de boa-sorte
São coisas que todos odeiam.
Portanto:
Quem está no Tao não se ocupam delas.
Quando em casa, o nobre honra seu lado esquerdo;
Quando usa armas, honra seu lado direito.
Armas não são instrumentos de boa-sorte
Não são instrumentos para nobres.
Mas se é impossível deixar de usá-las;
Utilize-as com calma e ponderação.
Ao vencer não louve a vitória.
Quem o faz alegra-se em assassinar;
E não pode alcançar seus objetivos no mundo.
Nos dias felizes prefere-se o lado esquerdo;
Nos dias infelizes prefere-se o lado direito.
O vice-comandante fica à esquerda;
O comandante fica a direita;
Do mesmo modo que o serviço fúnebre.
Massacres devem ser chorados com ais e lamentos;
Na vitória militar deve-se agir como em um serviço fúnebre.
Tao... Intocável e Inominável;
Embora muito pequeno;
O mundo inteiro não o pode controlar.
Se reis e príncipes o preservarem;
As dez-mil-coisas por si mesmas se controlam.
Céus e terra se unem para destilar doce orvalho;
E o povo sem governo por si mesmo se coordena.
Mas quando ocorre a limitação
Logo surgem os nomes.
Quando os nomes surgem
Deve-se então saber parar.
Sabendo-se parar
Não se corre perigo.
Uma similaridade do Tao no mundo:
Os riachos da montanhas e águas do vales;
Indo para o rio e mar.
Quem conhece os outros é inteligente;
Quem conhece a si mesmo é sábio.
Quem vence os outros é forte;
Quem vence a si mesmo é poderoso.
Quem é auto-suficiente é rico;
Quem persevera tem aspiração.
Quem não perde seu lugar é estável;
Quem na morte não morre é vivo.
O grande Tao é transbordante:
Está à direita,
Está à esquerda.
As dez-mil-coisas provêm dele;
E ele não as rejeita.
Realiza a obra;
E não as chama de propriedade.
Ele veste e alimenta as dez-mil-coisas
E não se assenhora delas.
Não tem desejos
E por isto é pequeno.
Mas como tudo depende dele
Chamamos grande.
Assim o homem santo:
Não se engrandece
Por isto executa a grande obra.
Quem é fiel ao Princípio
O mundo submete-se a ele.
Submete-se e não é prejudicado
E há grande paz.
Música e iguarias
Fazem o peregrino estagnar.
Mas o Tao surge da boca
Sem som e sem sabor.
Olha-se e nada se vê;
Ouve-se e nada se escuta;
Usa-se e nunca se esgota.
Para comprimir
Deve-se, primeiro, deixar expandir.
Para enfraquecer
Deve-se, primeiro, deixar fortalecer.
Para destruir
Deve-se, primeiro, deixar desabrochar.
Para retirar
Deve, primeiro, dar.
Isto é chamado:
Conhecer o invisível.
A leveza é maior que a dureza.
A fraqueza maior do que a fortaleza.
Não se tira o peixe das profundezas.
Não se mostra ao povo
Os mecanismos pela qual age o reino.
O Tao é eterno não-fazer:
E nada fica por fazer.
Se reis e príncipes o preservarem;
As dez-mil-coisas por si mesmas se transformam.
Se tudo se faz provocando desejo
Eu o evito através da simplicidade.
A simplicidade inominável não gera desejos;
A ausência de desejos cria a paz;
E o mundo se endireita por si mesmo.
A virtude superior não se ostenta virtude
Por isto tem virtude.
A virtude inferior não larga a virtude
Por isto não tem virtude.
A virtude superior não age
E por isto não deixa de agir.
A virtude inferior não age
E por isto deixa de agir.
Quando a moralidade atua e ninguém reage
Ela então atua com grande provocação.
Portanto:
Perdendo-se o Tao, eis a virtude;
Perdendo-se a virtude, eis o amor humano;
Perdendo-se o amor humano, eis a justiça;
Perdendo-se a justiça, eis a moralidade.
A moralidade reduz a fé e a fidelidade;
Sendo a origem de toda desordem.
O saber prematuro é mera aparência do Tao
E o começo de toda loucura.
Por isto o homem maduro:
Atem-se ao real e não à aparência;
Atem-se ao palpável e não ao impalpável;
Afasta o ali e agarra o aqui.
Esta é a unificação dos príncipios:
O céu uno ficou limpo
A terra una ficou sólida
O espírito uno ficou avivado
O vale uno ficou cheio
As dez-mil-coisas unas ficaram geradoras
Os reis e príncipes unos ficaram dignos
Isto pela unificação.
O céu não limpo talvez rachasse
A terra não sólida talvez vacilasse
O espírito não avivado talvez sucumbisse
O vale não cheio talvez se esgotasse
As dez-mil-coisas não geradoras talvez se extinguissem
Os reis e príncipes não dignos talvez se destronariam.
Por isto:
O nobre tem suas raízes no humilde
O alto tem seu fundamento no baixo.
Por isto
Reis e príncipes devem ser intitulados:
Orfãos, viúvos e sem mérito
Porque suas raízes está na humildade. Ou não ?
Portanto:
A glória verdadeira não se gloria.
Não deve-se buscar o esplendor do jade
Mas sim a rudeza da pedra.
O retorno é o movimento do Tao;
Suavidade é a operação do Tao.
Sob o céu:
As dez-mil-coisas nascem do ser
E o ser nasce do não-ser.
Quando uma pessoa superior escuta o Tao;
Ele o pratica zelosamente.
Quando uma pessoa mediana escuta o Tao;
Ela o segue alguns momentos;
Mas não o segue em outros.
Quando uma pessoa inferior escuta o Tao;
Ela ri dele às gargalhadas:
Se não rir alto,
Então não ouviu sobre o Tao.
Por isto existem as sentenças:
O Tao é claro, mas parece escuro;
O Tao é progressivo, mas parece retrógrado;
O Tao é plano, mas parece escabroso.
A Virtude é suprema, mas parece um vale;
A Virtude é firme, mas parece vazia;
A Virtude é sólida, mas parece vacilante.
O grande quadrado não tem cantos;
O grande talento não termina cedo;
A grande música não se ouve;
A grande imagem não tem definição.
O Tao oculta-se no sem-nome
E só o Tao pode bem atuar
Dando a si mesmo.
O Tao gera o Um;
O Um gera o Dois;
O Dois gera o Três;
O Três gera as dez-mil-coisas.
As dez-mil-coisas tem atrás de si escuridão;
A sua frente elas abraçam a luz;
E o vazio lhes dá a harmonia.
O que os homens mais detestam;
É serem orfãos, viúvos ou sem méritos;
Títulos de reis e príncipes.
Portanto:
As coisas se perdem quando se ganham;
E se ganham quando se perdem.
Eu também ensino conforme a tradição dos homens:
Os violentos não alcançam morte natural
Isto eu considero o fundamento do ensino.
Sob o céu:
O mais suave
Vence aquilo que é mais firme.
O não-manifesto
Penetra naquilo que é impenetrável.
Nisto reconheço o valor da não-ação.
O ensino sem palavras;
O valor da não-ação;
Sob o céu poucos conseguem.
O nome ou sua pessoa:
O que deveremos privilegiar ?
A pessoa ou suas posses:
O que deveremos valorizar ?
O ganho ou a perda:
O que é pior ?
Por isto:
Acumular coisas traz grande gasto.
Juntar coisas traz enorme desperdício.
Tendo-se o suficiente não se passa vergonha;
Sabendo controlar-se não se corre perigo;
E por isto pode-se durar permanentemente.
A Grande Realização parece insuficiente;
Mas seu efeito é permanente.
A Grande Abundância parece vazia;
Mas seu efeito é inesgotável.
A Grande Retidão parece tortuosa;
A Grande Habilidade parece tolice;
A Grande eloquência parece balbuciante.
O movimento vence o frio;
O repouso vence o calor;
Pureza e repouso são os padrões do mundo.
Quando o Tao reina sob o céu
Usamos corcéis para carregar esterco.
Quando o Tao não reina sob o céu
Cavalos de batalha procriam nos pastos verdes.
O maior erro é submeter-se ao desejo;
A maior violação é ser insaciável;
A maior falta é querer possuir.
Por isto:
Saber bastar-se no que basta é o bastante.
Sem sair de casa
Pode-se conhecer o mundo.
Sem olhar pela janela
Pode-se ver o Tao do céu.
Quanto mais longe se vai
Menos se conhece.
Por isto:
O homem santo
Não viaja e conhece;
Não olha e sabe;
Não age e realiza.
No estudo a cada dia se cresce mais
No Tao a cada dia se decresce mais
E decresce, decresce
Até chegar-se à não-ação.
Na não-ação nada deixa de agir.
Conquista-se o mundo
Quando não se tem o que fazer.
Quando se tem o que fazer
Não se conquista o mundo.
O homem santo não tem coração:
Ele faz seu o coração das cem-famílias.
"Para os bons, sou bom;
Para os não-bons também sou bom;
Esta é a bondade da virtude."
"Com o fiel, sou fiel;
Com o infiel também sou fiel;
Esta é a fidelidade da virtude."
Sob o céu, o homem santo é pacífico
E faz com que os corações se unam.
As cem-famílias lhe dão olhos e ouvidos
E o homem santo as recebe como suas crianças.
Expôr vida é impôr morte.
Três em dez são companheiros na vida;
Três em dez são companheiros na morte;
Três em dez são companheiros que caminham para o campo de morte.
E qual é a razão ?
Por viverem intensamente a vida.
Ouve-se do que bem cultiva a vida:
Por terra não encontra rinocerontes ou tigres
Entre um exército não sofre com armas e escudos.
O rinoceronte não encontra onde cravar o chifre;
O tigre não tem onde cravar as garras;
As armas não encontram onde cravar a lâmina.
E qual é a razão ?
O homem santo não tem campo de morte.
O Tao dá vida;
A virtude cultiva;
O ambiente molda;
As influências desenvolvem.
Por isto as dez-mil-coisas
Honram o Tao e dignificam a virtude.
O Tao é honrado e a virtude dignificada
Isto não se ordena mas vem espontâneamente.
Portanto:
O Tao dá vida;
A virtude cultiva;
E o crescimento se aprimora;
E a proteção amadurece;
E a manutenção se renova.
O mundo tem uma origem
Que pode-se chamar Mãe do mundo.
Quem tem a mãe
Conhece seu filho;
Quem conhece o filho
Retorna para a mãe.
Desaparecendo o corpo
Não há perigo.
Fechando as entradas
Trancando suas portas
Findando o corpo
Não há perigos.
Abrindo as entradas;
Aumentando seus afazeres;
Findando o corpo;
Não há salvação.
Ver pequenas coisas chama-se discernimento;
Conservar a suavidade chama-se força.
Se usarmos nossa luz para retornar à iluminação
Não haverá perigo quando este corpo passar:
Isto é chamado vestir-se da eternidade.
Se eu tivesse o conhecimento
De como agir de acordo com o grande Tao
Justamente temeria a atividade.
O grande Tao é uma linha reta
Mas o povo prefere atalhos.
Onde a corte é rígida
Os campos enchem-se de ervas daninhas
E celeiros ficam vazios.
Enfeitam-se com brocados;
Andam com espadas afiadas;
Refinam-se no comer e beber;
Com bens e riquezas excessivos.
Isto é chamado: ostentar rapina
Não, isto não é o Tao.
Quem planta o bem não perde a raiz;
Quem abraça o bem não se separa;
E seus filhos e netos
Não cessarão de lembrar dele.
Quem cultiva a virtude em si é eficiente;
Quem cultiva a virtude na família é pleno;
Quem cultiva a virtude na família é durável;
Quem cultiva a virtude no reino é fecundo;
Quem cultiva a virtude no mundo é imenso.
Portanto:
Através de si veja os outros;
Através de sua família veja as famílias;
Através de sua comunidade veja as comunidades;
Através de seu reino veja os reinos;
Através de seu mundo veja os mundos.
E como sei que o mundo é assim ?
Pelo que está aqui.
Quem mantém a plenitude da virtude
É como uma criança recém-nascida:
Insetos venenosos não a picam.
Feras não a atacam.
Aves de rapina não a raptam.
Possui ossos frágeis e tendões elásticos
Mas agarra com força.
Não conhece a relação sexual
Mas seu sangue se estimula
Pois possui a plenitude do sêmen.
O dia inteiro grita sem rouquejar
Pois possui o auge da harmonia.
Conhecer a harmonia é ser eterno;
Conhecer a eternidade é ser iluminado;
Acrescer a vida é fatalidade;
O coração no controle da vida é rigidez.
Quando as coisas se fortalecem, caducam.
Isto se diz sem-Tao:
Quando sem-Tao não há Tao.
Quem sabe não fala
Quem fala não sabe.
Fechar as entradas;
Trancar as portas;
Abrandar o cume;
Desfazer o emaranhado;
Moderar a luz;
Reunir o pó:
Isto chama-se união misteriosa com o Tao.
Portanto quem a tem:
É incompatível com a intimidade;
É incompatível com a estranheza;
É incompatível com o lucro;
É incompatível com a perda;
É incompatível com a glória;
É incompatível com a vileza.
Por isto:
Constitui-se glorioso no mundo.
Pela normalidade governa-se um reino;
Pela anormalidade usam-se armas;
Mas quando não há atividades
Conquista-se o mundo.
Mas como sei que é assim ?
Pelo que está aqui.
Sob o céu:
Quanto mais proibições e superstições
Mais o povo se empobrece.
Quanto maior o poder de guerra
Mais o reino se arruina.
Quanto maior a arte e esperteza dos homens
Mais presságios nefastos surgirão.
Quanto mais leis e decretos promulgados
Mais ladrões e assaltantes surgirão.
Por isto um homem santo disse:
Eu não-ajo e o povo muda por si;
Eu amo o repouso e o povo endireita por si;
Eu nada empreendo e o povo enriquece por si;
Eu não tenho desejos e o povo torna-se como madeira não esculpida por si.
Com governo tranquilo e discreto
O povo é expressivo e honesto.
Com governo vigilante e atuante
O povo é retraído e omisso.
Na desgraça apoia-se a felicidade;
Na felicidade encosta-se a desgraça;
E quem conhece seus limites ?
Na ausência de leis
O normal passa por anormal
E o bom passa por ilusão.
O desvio do homem
Com teimosia dura muitos dias.
Por isto o homem santo:
Delimita sem demarcar;
Modela sem talhar;
Corrige sem deformar;
Brilha sem ofuscar.
No governo dos homens;
No serviço do céu;
Não há nada como a moderação.
Pois com moderação
Há submissão prévia;
Com submissão prévia
Há reiteração da virtude.
Reiteração da virtude:
Invencibilidade!
Invencibilidade:
Não se conhecem as limitações!
Sem limitações:
Pode-se possuir o reino!
Tendo a Mãe do mundo:
Duramos eternamente.
Isto se diz:
Raiz profunda;
Fundamento sólido;
O Tao da existência eterna;
E da visão perpétua.
Governar um grande reino
É como fritar peixe pequeno.
Quando o mundo é governado pelo Tao
Os mortos não se passam por espíritos.
Não somente os mortos não se passam por espíritos
Mas os espíritos também não atormentam pessoas.
Não somente os espíritos não atormentam pessoas
Mas o homem santo também não as atormenta.
Quando ambos não se atormentam
A virtude conjuga seus efeitos.
Um grande reino é um rio de baixo curso:
Lugar de reunião do mundo,
Feminino do mundo.
O feminino pela sua passividade
Vence o masculino;
Porque por sua passividade
Ela se mantém abaixo.
Portanto:
Se um grande reino submete-se a um pequeno
O grande conquista o pequeno.
Se um pequeno reino submete-se a um grande
O pequeno conquista o grande.
Assim:
Uns submetem-se para conquistar;
Outros submetidos conquistam.
Um grande reino
Só quer juntar e alimentar pessoas.
Um pequeno reino
Só quer participar do serviço das pessoas.
Mas para que ambos consigam seu desejo
O grande deve sempre submeter-se.
O Tao é o refúgio das dez-mil-coisas:
Tesouro dos bons,
Refúgio dos não-bons.
Com belas palavras negocia-se honras;
Com nobre conduta destaca-se diante dos outros;
Mas porque deveríamos rejeitar os não-bons ?
Por isto:
Foi investido o filho do céu;
E estabelecidos os três príncipes.
Mas, empunhar o cetro de jade,
E desfilar em um cortejo festivo
Não se iguala a assentar e adentrar no Tao.
E qual a razão dos antigos apreciarem o Tao ?
Não é porque se diz:
"Quem pede recebe
Quem errou evita a perversão?".
Por isto o Tao é o bem mais precioso do mundo.
Agir o não-agir;
Ocupar o não-ocupar;
Saborear o não-saborear;
Engrandecer o pequeno;
Retribuir rancor com virtude;
Planejar o difícil quando ainda é fácil;
Fazer o grande do que é pequeno.
Por isto o homem santo:
Não se engrandece
E realiza grandes atos.
Quem promete levianamente
Não merece crédito.
O que se acha muito fácil
Acaba sendo muito difícil.
Por isto o homem santo:
Considera tudo bem difícil
E por isto tudo fica fácil.
O que é calmo é fácil manter;
O que não surgiu é fácil programar;
O que é frágil é fácil quebrar;
O que é pequeno é fácil espalhar.
Deve-se agir no que ainda não-foi;
Deve-se pôr em ordem antes da desordem.
Uma árvore com braças de diâmetro
Nasce como uma raiz de cabelo.
Uma torre de nove andares
Surge de terra amontoada.
Uma viagem de uma milha
Começa sob os pés.
Quem age arruina;
Quem segura perde.
O povo após terminar uma obra sempre o estraga;
Cuidando do fim como do começo nada se estraga.
Por isto o homem santo:
Deseja não desejar;
Não valoriza bens custosos;
Aprende não-aprendendo;
Recorre ao que o povo deixa de lado;
Ajuda a natureza das dez-mil-coisas;
E nunca ousa agir.
Na antiguidade os que bem atuavam no Tao
Não buscavam a iluminação do povo
Mas sim a sua simplicidade.
Não é possível governar o povo
Quando ele sabe demais.
Portanto:
Governar pela sabedoria
É roubar a nação.
Não governar pela sabedoria
É prosperar a nação.
Quem conhece estes dois
Aprofunda-se no ideal.
Saber aprofundar-se no ideal
Chama-se de Virtude oculta.
Virtude oculta:
Profunda ! Distante !
Vem com as dez-mil-coisas
E resulta na grande concordância.
Rios e mares regem os cem vales
Por saberem manter-se abaixo deles:
Portanto regem os cem vales.
Assim o homem santo:
Se deseja ficar acima do povo
Coloca-se abaixo quando fala.
Se deseja ficar a frente do povo
Coloca-se atrás.
Portanto o homem santo:
Fica acima
E o povo não sente seu peso.
Fica à frente
E o povo não sofre prejuízo.
Assim:
O mundo com alegria é impelido
E não há nenhuma opressão.
Como não há disputa
Ninguém sob o céu pode com ele disputar.
Sob o céu todos dizem
Que meu Tao é grande
E por isto é anormal.
Por ser grande parece anormal:
Porque se fosse normal
Há muito teria ficado pequeno.
Três jóias aprecio e preservo:
A primeira chama-se misericórdia;
A segunda chama-se moderação;
A terceira chama-se não buscar o poder.
Antes a misericórdia, depois coragem;
Antes moderação, depois generosidade;
Antes não buscar o poder, depois liderar homens de talento.
Mas se:
Sem misericórdia querer-se coragem;
Sem moderação querer-se generosidade;
Sem ficar atrás querer poder:
Isto é morte.
Se na guerra atacar com misericórdia
Vence-se.
Se na defensiva
Fortalece-se.
Por isto aquele que o céu quer salvar
É protegido pela misericórdia.
O bom militar não é marcial;
O bom guerreiro não é colérico;
O bom vencedor não precisa lutar;
O bom utilizador de homens submete-se a eles.
Isto é chamado: virtude sem luta;
Isto é chamado: força que manipula os homens;
Isto é chamado: o auge da união com o céu.
Do estrategista existe este ditado:
"Não ouso ser o senhor, mas o hóspede.
Não ouso avançar uma polegada, mas recuar um passo".
Isto se chama:
Avançar sem pernas;
Lutar sem braços;
Repelir sem atacar;
Capturar sem armas.
O maior desastre é subestimar o inimigo:
Subestimando o inimigo perco as minhas jóias.
Portanto:
Quando exércitos se confrontam,
Vence o mais compassivo.
Minhas palavras
São fáceis de entender,
São fáceis de praticar.
Mas sob o céu
Não são compreendidas,
Não são praticadas.
As palavras tem tradição;
Os eventos tem um senhor;
E por serem incompreendidos,
Eu também sou incompreendido.
Os que me conhecem são raros,
E nisto está o meu valor.
Por isto:
Sob as vestes de aldeão
O homem santo esconde jade.
Saber o não-saber é o bem superior;
Não-saber o saber é uma alienação.
O homem santo não é alienado;
Ele aliena a alienação.
E por alienar a alienação
Ele não é um alienado.
E somente por isto
Não é um alienado.
Se o povo não teme a autoridade
Então vem a grande autoridade:
Nada diminui sua moradia;
Nada oprime a subsistência;
E por não haver opressão não há aborrecimento.
Por isto o homem santo:
Conhece a si mesmo, mas não se exibe;
Ama a si mesmo, mas não se glorifica.
Portanto:
Ele recusa o ali e admite o aqui.
Quem mostra coragem com ousadia morre;
Quem mostra coragem sem ousadia sobrevive:
Dos dois um ganha e outro perde.
Mas alguém sabe a razão
Porque o céu abomina alguém ?
Por isto o homem santo vê as dificuldades.
O Tao do céu :
Sem lutar é hábil em vencer;
Sem falar é hábil em responder;
Sem sinalizar vêm por si;
Passo-a-passo é hábil em planejar.
A rede do céu tem malhas largas;
Mas nada passa por elas.
Se o povo não teme a morte
Para quê intimidá-lo com a morte ?
Se o povo sempre teme a morte
E uma pessoa age de forma estranha
Devo capturá-la e matá-la ?
Quem ousaria isto ?
Há sempre o ofício da morte a executar.
Querer tomar o lugar da morte
É como querer talhar no lugar do lenhador:
Dificilmente deixará de ferir as mãos.
A fome do povo
É fruto dos seus superiores devorarem impostos:
Por isto há fome.
O desgoverno do povo
É fruto dos seus superiores se intrometerem demais:
Por isto há desgoverno.
O descaso do povo com a morte
É fruto dos seus superiores viverem na boa-vida:
Por isto o descaso com a morte.
Por isto aquele que não-age na vida
É o único que pode dignificar a vida.
Quando nasce, um homem é suave e fraco;
Quando morre, um homem é rígido e forte.
Quando nasce, uma planta é suave e fraca;
Quando morre, uma planta é murcha e seca.
Por isto:
Rigidez e força são companheiros da morte;
Suavidade e fraqueza são companheiros da vida.
Por isto:
Se as armas são fortes não serão vitoriosas;
Se as árvores são fortes serão abatidas.
Força e grandeza fazem diminuir;
Suavidade e fraqueza fazem crescer.
O Tao do céu...
Como lembra o armar de um arco !
O que é alto, abaixa-se;
O que é baixo, levanta-se;
O que tem mais, tira-se;
O que tem menos, completa-se.
O Tao do céu:
Tira do mais e completa o menos.
O Tao do homem é o contrário:
Tira do menos para dar ao mais.
Mas quem tem a mais para dar ao mundo ?
Só o possuidor do Tao.
Assim também o homem santo:
Age sem depender;
Realiza a obra sem se apegar.
Ele não quer mostrar-se importante.
Sob o céu:
Não há nada mais fluido e suave do que a água;
Não há o que a iguale no ataque ao duro e forte;
E nada pode modificá-la.
A fraqueza vence a força.
A suavidade vence a dureza.
Sob o céu:
Isto se não pode conhecer;
Isto não se pode praticar.
Por isto disse um homem santo:
Quem suporta a sujeira do reino
Esse é o senhor dos sacrifícios da terra.
Quem suporta os males do reino
Esse é o rei do mundo.
Palavras corretas sempre parecem contraditórias.
Quando se aplaca uma grande discórdia,
Sempre resta alguma discórdia.
Como considerar que seja algo bom ?
Por isto o homem santo:
Cumpre sua parte do contrato,
Mas não obriga a outra parte.
Quem tem virtude
Cumpre seu dever.
Quem não tem virtude
Cobra dos outros.
O Tao do céu não tem sentimentos,
Mas sempre está com o homem bom.
Um reino deve ser pequeno
E ter poucas pessoas.
Utensílios que aumentam a força
Não devem ser utilizados.
As pessoas devem temer a morte
E não migrar.
Barcos e carros
Não devem ser movidos.
Armas e couraças
Não devem ser exibidas.
Que o povo volte ao uso de nós em cordas;
Ao doce do seu alimento, à beleza de suas roupas;
À paz de sua casa e ao conforto dos seus costumes.
Com reinos vizinhos, aqui e ali;
Com canto de galos e latidos de cães, aqui e ali;
Com gente envelhecendo e morrendo,
Sem mudar para lá e para cá, aqui e ali.
Palavras verdadeiras não são belas;
Belas palavras não são verdadeiras.
O bom não se discute;
E o que se discute não é bom.
Saber não é erudição;
Erudição não é saber.
O homem santo não acumula bens:
Mais possui quanto mais faz pelos outros;
Mais recebe quanto mais dá aos outros.
O Tao do céu beneficia sem prejudicar;
O Tao do homem santo age sem lutar.