CRISTO, Jesus → ReligiãoCatolicismoProtestantismo → Igreja Ortodoxa

Cristo não pertence ao Cristianismo, mas ao mundo inteiro
(Gandhi)

O aparecimento da figura de Cristo dividiu a história da Humanidade em duas épocas: Antes e Depois DELE. A partir de Jesus Cristo, criou-se um novo calendário, começando uma nova Era, a "NOSSA ERA", a da civilização cristã. A cultura ocidental, antes de Cristo, era dominada por uma concepção religiosa mesquinha, incestuosa e vingativa. Basta citar dois episódios semelhantes, um ligado ao Politeísmo greco-romano e outro ao Judaísmo hebraico, cuja lembrança ofende indelevelmente a inteligência e o sentimento humano: Agamenão, que está pronto a sacrificar à vingativa deusa Diana sua jovem filha Ifigênia, e Abraão, disposto a matar seu filho Isaac para superar o "teste" de obediência a que o submeteu o caprichoso Jeová. Jesus veio ao mundo para inverter esta lógica milenar com um ensinamento simples: amar a Deus é amar o próximo, o ser que está ao nosso lado e a realidade que nos circunda. Os deuses pagãos e o deus do Velho Testamento foram substituídos pelo Deus da misericórdia. Essa nova concepção da divindade atravessou toda a história das religiões. O maior milagre que circunda a figura de Cristo foi o de ter conseguido concentrar na sua pessoa o que houve de bom antes e depois dele: o monoteísmo, a crença num único deus, sistema criado pelo filósofo persa Zoroastro e adotado pelo Judaísmo; a observância das normas morais que se encontram no Velho Testamento (→ Bíblia); a utopia socialista de Platão; o pacifismo e a tolerância ensinados pelos textos dos Vedas da Índia (→ Budismo). Após sua morte, a Palavra de Cristo revolucionou o curso da humanidade. O historiador britânico Edward Gibbon (1737–1794), na sua vasta obra em cinco volumes, Declínio e Queda do Império Romano, defende a tese de que o Cristianismo foi a causa principal da decadência da maior potência da Antiguidade pela sua pregação pacifista e por projetar a felicidade num mundo sobrenatural. De outro lado, o sociólogo alemão Max Weber (1864–1920), na obra clássica A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo, mostra como os princípios do Cristianismo, na sua versão luterana e calvinista, nortearam a construção da maior potência do mundo atual, o império econômico dos Estados Unidos da América do Norte. A base do sucesso da civilização anglo-saxônica e norte-americana, segundo Weber, estaria na "Ética do Trabalho", propugnada nos evangelhos e nas epístolas do apóstolo Paulo e praticada principalmente por ingleses e americanos, convencidos de que a riqueza é um sinal da bênção divina.

Mas, afinal, quem foi este "Jesus Cristo" que, sem sair da Palestina e sem escrever uma linha sequer, foi capaz de derrubar o maior império antigo e de construir a maior potência da atualidade? As notícias sobre sua personalidade encontram-se, essencialmente, nos quatro evangelhos (→ Bíblia). O pouco que sabemos sobre a pessoa histórica de Jesus Cristo pode ser assim resumido: de religião judaica, nasceu em Belém, filho de Maria e do carpinteiro José, na época em que Herodes governava na Galiléia, província romana, no início da nossa Era (→ Idade). Já com trinta anos (por volta do ano 27 ou 28), junto com João Batista, começou sua pregação. Transmitiu sua mensagem de paz e de amor através de discursos e de parábolas, cativando a atenção dos mais humildes. Corroborou sua palavra com atos milagrosos, sendo considerado um taumaturgo. Mas sua fama começou a incomodar judeus e romanos. Os fariseus não aceitavam sua concepção de messianismo (a palavra "christus" é uma transcrição literal do grego Khristos que, por sua vez, é a tradução do hebraico mashiah, que significa "Messias", a pessoa consagrada pela unção). Para os hebreus, o Messias, anunciado no Velho Testamento, devia ser não um pobre descalço, mas um Rei poderoso que libertasse o povo do jugo de Roma. Também para os romanos, a mensagem de Cristo era politicamente perigosa, pois podia sublevar a massa popular contra o Império, deixando de pagar os impostos. Assim, depois de um ou dois anos de apostolado itinerante, Jesus Cristo foi vítima de uma coalizão entre dirigentes judeus e a autoridade romana. Traído por um dos seus discípulos, Judas Iscariota, e capturado quando estava em Jerusalém, ao redor do ano 30, foi julgado e condenado à morte por ordem de Pôncio Pilatos, Procurador romano, com o consenso do povo hebreu. Após a flagelação, foi crucificado sob a acusação de ser um agitador público. Segundo a tradição cristã, ele teria ressuscitado na Páscoa, após três dias de sepultamento, aparecendo a seus discípulos, que se tornaram Apóstolos, que em grego significa "Enviados", pois lhes foi dada a missão de difundir para o mundo todo os ensinamento de Cristo.

Os escritos do Novo Testamento, que contem a essência da doutrina cristã, foram submetidos a várias interpretações, através dos tempos. Na época pós-freudiana, o Evangelho começou a ser lido à luz da psicanálise (→ Psiquê), ressaltando a dimensão humana da existência de Cristo, independentemente da crença na sua filiação divina. As histórias escritas pelos quatro evangelistas contêm elementos simbólicos que merecem novas interpretações, especialmente após as contribuições de Freud e de seus discípulos para o estudo das profundidades da alma e o empenho dos historiadores, a partir do século passado, na pesquisa sobre a figura histórica de Cristo, revelando seu aspecto profundamente humano. Infelizmente, a identidade verdadeira de Jesus de Nazareth, através dos séculos, foi eclipsada pelo mito da esfinge devoradora que mata quem não souber decifrar seu enigma. O Cristo, filho de Deus, acabou matando o Jesus homem! As discussões sobre a humanidade e a divindade de Cristo se tornaram cada vez mais calorosas e estão longe de ter um fim. Recentemente, saiu publicado no Brasil o best-seller americano O Código Da Vinci, romance de Dan Brown, em que o autor tenta demonstrar, pelo exame do famoso quadro A Última Ceia, de Leonardo da Vinci, a tese herética de que Jesus seria amante de Maria Madalena, com a qual teria tido vários filhos. Nesta mesma obra , o crítico norte-americano observa que o reconhecimento de Jesus Cristo como "Filho de Deus", se deu apenas "por votação" dos bispos no Concílio de Nicéia (325), mais de três séculos depois de sua morte. Anteriormente, Jesus era visto pelos cristãos e pelos romanos (o historiador Tácito faz referência a ele) apenas como um grande profeta e um homem milagroso. Entre os poucos documentos arqueológicos, descobertos recentemente na Palestina, está o ossuário de Tiago, uma urna funerária em que se lê, na língua aramaica e gravado numa pedra, o seguinte epitáfio: "Tiago, filho de José, irmão de Jesus". Se esta inscrição fosse historicamente verdadeira, referindo-se propriamente ao Filho da Virgem Maria, poderia abalar a crença na divindade de Cristo, pois Ele não seria mais o "Filho Único de Deus", como se lê nos evangelhos escritos por seus discípulos.

Independentemente da verdade histórica, o que é palpável e infinitamente importante do ponto de vista cultural é que os episódios e os ensinamentos evangélicos são metáforas da nossa vida cotidiana: o filho pródigo, o bom samaritano, a ressurreição de Lázaro, o estímulo ao trabalho, a condenação de qualquer forma de violência e a constante exortação ao amor estruturaram o pensamento ocidental, influenciando filosofia, artes e literatura, além da psicanálise clássica e moderna. O romancista José Saramago (O Evangelho segundo Jesus Cristo) e o cineasta Pier Paolo Pasolini (O Evangelho segundo São Mateus), são exemplos de intelectuais contemporâneos que estudaram a figura de Cristo, tendo em comum a contradição de serem, ao mesmo tempo, católicos e comunistas. Ambos consideram a figura histórica de Jesus como um doce e pacífico provocador que queria vencer, pelo amor, o egoísmo individual e de classes, passando a ser considerado o precursor do socialismo. Outros filmes polêmicos de grandes diretores sobre a figura de Jesus: Viridiana (1961), do espanhol Luis Buñuel; Goldspell (1973), de Davis Greene; A Vida de Brian (1979), do iconoclasta Terry Jones, da seta inglesa Monty Python; Je vous salue, Marie, do suíço Jean-Luc Godard (1985); A Última tentação de Cristo (1988), do americano Martin Scorsese e, mais recentemente, A Paixão de Cristo (2004), do ator-diretor Mel Gibson. O assunto é polêmico pela sua própria natureza, pois todo o ato de acreditar sempre traz em si algo de místico, quer seja o credo num Cristo, filho de Deus, Redentor da Humanidade, quer na crença num ideal de justiça social contrastante com o profundo egoísmo individual e de grupos. O Cristianismo, como o Comunismo, por serem ambos ideológicos, são igualmente utópicos. Os dois credos não foram aprovados no exame da história: após mais de dois milênios, a pregação evangélica continua a mesma, com resultados irrelevantes no que toca o ponto crucial da vida humana, a justiça social, e a revolução comunista se espatifou perante o muro de um estadismo burocrático, corrupto e tirano. A figura de Jesus, seja como for, permanece incontestável no bojo do sentimento religioso da maioria dos povos que habitam a terra. Em Cristo estão centrados o Catolicismo, o Protestantismo (nas suas diferentes seitas → Lutero), o Islamismo (o profeta Maomé, o novo enviado de Deus, pode ser considerado uma reencarnação de Cristo, provocada pela decepção com o cristianismo europeu, na Idade Média) e as Igrejas Ortodoxas do Oriente.