ABSOLUTISMO (imperialismo, tirania, despotismo, mito de Júpiter) → Política
(Martin Seymour-Smith)
O termo "absoluto", do étimo latino absolutus ("solto", liberado, que não depende de nada e de ninguém) foi usado, primeiramente, por filósofos preocupados em descobrir a origem do mundo na pressuposição de que existisse uma entidade "por si mesma", desligada da matéria cósmica e, portanto, transcendental, auto-suficiente, incondicionada, eterna, que as religiões monoteísticas chamam de Deus, de um modo geral, mas a que os filósofos, no decorrer da história, deram vários nomes, conforme concepções diferenciadas acerca da mesma idéia de absoluto. Assim, por exemplo, Parmênides fala de "Esfera", Platão de "Idéia", Aristóteles de "Primeiro Motor Imóvel", Plotino de "Uno", Espinosa de "Substância", Kant de "A Coisa em si", Fichte do "Eu", Hegel de "O Espírito Absoluto" (Idealismo). No campo político, o Absolutismo é um sistema de governo onde apenas uma pessoa (Monarca, Rei, Soberano, Déspota, Tirano, Czar, Xeque, Imperador) concentra em si todo o poder, sem algum limite e sem precisar justificar seus atos de soberania. Num sentido amplo, o Absolutismo sempre existiu em muitos países da Terra e continua sendo praticado até hoje. O sistema vigora onde o mito de Júpiter se personifica num indivíduo que consegue enfeixar em si todos os poderes de uma coletividade, suprimindo as liberdades individuais. Neste sentido, o termo Absolutismo torna-se quase sinônimo de Tirania, Despotismo, Ditadura, Imperialismo, este último vocábulo indicando a opressão de uma nação sobre outras. Veja-se, ao longo da história, a sucessão dos vários impérios: persa, macedônico, romano, otomano, hispânico, inglês, napoleônico, soviético, o "Celeste Império" chinês, o "Império do Sol Nascente" japonês , as chamadas "Repúblicas de Bananas" da América Latina, dominadas por Presidentes não eleitos pelo povo de uma forma honesta ou sustentados pela força militar. O Absolutismo reina até nos pequenos aglomerados indígenas, onde o cacique tem poder de vida e de morte sobre os membros da sua tribo, como também na moderna globalização, pela qual os monopólios se aglutinam cada vez mais e se internacionalizam, às custas dos países de tecnologia ainda atrasada, de economia emergente, incapazes de competir, pois vítimas do protecionismo alfandegário, de dívidas externas com altíssima taxa de risco e, evidentemente, da incompetência e corrupção de seus governantes. No dizer do cientista político Eric Hobsbawn, "poucas coisas são mais perigosas do que impérios que perseguem seus próprios interesses na crença de que estão fazendo um favor à humanidade". Será que ainda existe alguém tão ingênuo ao ponto de pensar que alguma instituição financeira nacional ou internacional seja beneficente ao emprestar dinheiro a necessitados, sem tirar todo o lucro que puder? Como no mundo físico, assim no reino econômico, "a razão do mais forte é sempre a melhor", segundo o provérbio clássico do gênero Fábula, cultivado pelo grego Esopo, o romano Fedro e o francês La Fontaine.
Num sentido estrito, o termo Absolutismo está relacionado, historicamente, com as Monarquias da Europa Ocidental dominantes nos séculos XVII e XVIII, e na Rússia czarista, chegando até o início do século XX. Seu substrato ideológico pode ser encontrado no pensamento do filósofo inglês Thomas Hobbes (1588–1679). Especialmente na obra Leviathan, ele tenta demonstrar sua teoria do poder político, fundamentada num materialismo mecanicista: a sociedade humana é vítima de egoísmos individuais e de grupos que a levam a uma guerra de todos contra todos. Homo homini lupus ("O homem é lobo do homem"), dizia ele. Para evitar tal conflito, faz-se necessário que o homem renuncie a seus direitos naturais, em benefício de um soberano cujos direitos ilimitados lhe permitem fazer reinar a ordem e a paz. Mas, perguntaríamos ao Hobbes, se ainda fosse vivo, "e se o soberano, como costuma ser, for um tirano?" Não seria melhor educar o povo para o exercício do direito democrático, em lugar de confiar num "salvador da pátria?" Podemos relevar quatro focos de domínio absolutista na Europa, que antecederam o início das monarquias constitucionais e dos governos democráticos: 1) A Península Ibérica: a longa e sangrenta luta dos povos cristãos contra os árabes maometanos, que invadiram toda a faixa mediterrânea da Europa a partir do século VII, fez com que os diversos e numerosos contados se agrupassem em três grandes Estados: Castela, Aragão e Portugal, que se reduziram a dois quando, no final do século XV, o casamento de Isabel de Castela com Fernando de Aragão teve como resultado a junção dos dois Estados e o fim do domínio árabe na Europa. Para reprimir quaisquer veleidades de insubordinação política ou religiosa, os sucessivos monarcas de Espanha e Portugal se serviram amplamente do Tribunal da Inquisição, manipulado pela Companhia de Jesus, ordem da religião católica encarregada de fazer obedecer, a qualquer custo, as prescrições da Contra-Reforma, proclamadas pelo Concílio de Trento, terminado em 1563 (→ Lutero). 2) A França de Luís XIV, o modelo quase perfeito do monarca absoluto, ele que disse: "o Estado sou eu". O processo de formação do regime absolutista na França começou com a ação do grande estadista Cardeal de Richelieu, em 1624, nomeado primeiro-ministro do rei Luís XIII, que conseguiu acabar com o poder dos nobres, arrogantes e incontentáveis, concentrando o poder nas mãos do soberano, e continuou com o Cardeal Mazarino, primeiro-ministro de Luís XIV. Mas este Rei, bem mais ativo e corajoso do que seu antecessor, logo tomou para si as rédeas do governo, conferindo a seus ministros e secretários apenas a função de conselheiros: a ele cabia o poder decisório sobre todos os negócios do país. Considerando o soberano como um ser excepcional, quase transcendental, fez com que a magnificência real se manifestasse também exteriormente através de uma suntuosidade refinada e impondo regras rígidas de etiqueta social. Mandou construir o palácio de Versalhes, o mais luxuoso do mundo, como sua residência, e estimulou o triunfo da inteligência, especialmente no campo das Letras. Pertencem a sua época os três famosos dramaturgos neoclássicos: Corneille, Racine e Molière. Por tudo isso, passou à história com o apelido de "Rei Sol". 3) O período do Absolutismo na Inglaterra: o povo inglês, desde a Idade Média até hoje, cultivou a tradição de uma forma de governo fundamentada numa monarquia relativa, mais representativa do que dominadora, subordinada ao poder do Parlamento, composto pela Câmara dos Lordes e a Câmara dos Comuns. Mas essa tradição foi quebrada pela ascensão ao trono do rei escocês Jaime Stuart, em 1603. Até 1688, ano da chamada Revolução Gloriosa, quando Guilherme de Orange, elevado ao trono por um levante geral, promulgou a primeira "Declaração de Direitos", o Reino Unido da Grã-Bretanha sofreu uma forma de governo ditatorial durante a dinastia dos Stuart que, além de acabarem com as liberdades políticas, adeptos da Igreja Anglicana, perseguiram católicos e calvinistas. Mesmo na época da chamada República de Cromwell, que se seguiu ao domínio stuartiano, o Lorde Protetor, que tanta glória militar deu à Inglaterra, não deixou de governar de modo ditatorial. 4) O Tzarismo russo: Tsar , Czar ou Zar era o nome que se dava ao Imperador da Rússia , uma extensa região da Europa Oriental habitada por povos de várias etnias. Na verdade, o povo russo sempre viveu num regime ditatorial, quer no longo período dos czares, sendo o mais famoso Pedro I, o Grande, em cuja homenagem foi fundada, em 1703, Petersburgo, cidade que se tornou a capital do vasto império, quer no período do domínio do regime comunista, que começou com a Revolução Bolchevique, em 1917, chefiada por Stalin e Lênin. Não à-toa que este último definiu o Estado como "a organização especial da violência". Realmente, a União Soviética nunca gozou de um governo propriamente democrático, pois o absolutismo de direita foi substituído por uma ditadura de esquerda. O absolutismo comunista terminou na antiga URSS, mas continua na China, na Coréia do Norte, na ilha de Cuba (→ Marx).