ALEXANDRE, Magno (Biblioteca de Alexandria) → Helenismo
Alexandre é o nome de vários monarcas, santos e papas. O mais famoso, sem dúvida, foi Alexandre o "Grande" (356–323), filho de Felipe II, rei da Macedônia, a quem se deve o início do mundo helenístico, que começou com o período alexandrino, por ter difundido a cultura produzida na Grécia clássica (século V, época de Péricles ou de Atenas) por todo o imenso território por ele conquistado. Conseguindo famosas vitórias sobre o império persa, subjugou a Grécia, Ásia Menor, Egito, grande parte da costa do Mediterrâneo e do Oriente Médio, tentando avançar até à Índia. Ele se tornou imortal porque, além de um grande estrategista de guerra, foi amante e difusor da cultura. No Egito, precisamente no Delta do rio Nilo, fundou a cidade que leva seu nome, Alexandria que, depois de Atenas e antes de Roma, fora a maior metrópole intelectual e artística do mundo helenístico. Famosa foi sua Biblioteca, construída por Ptolomeu que lhe sucedeu, com um acervo de mais de 700.000 obras literárias e científicas, onde se reuniam filósofos, poetas, cientistas e tradutores que vertiam, para a língua grega, manuscritos de diversos idiomas do Mediterrâneo, do Oriente Médio e da Índia. Infelizmente, a biblioteca sofreu dois incêndios, em 47 a.C. e em 391 d.C. A Nova Biblioteca de Alexandria foi construída, com base num projeto do arquiteto norueguês Kito Thorson, entre 1988 e 1995, abrigando cerca de cinco milhões de volumes. O complexo de 11 andares, que emergem como um disco gigantesco inclinado em direção ao Mediterrâneo, inclui três museus, seis galerias, cinco institutos de pesquisa, um salão de conferências e um planetário.
Além da Biblioteca, Alexandria possuía um museu, uma escola filosófica neoplatônica, onde lecionaram Plotino e Porfírio, e uma Escola de Matemática, famosa por ter divulgado Os Elementos, de Euclides e alguns trabalhos de Arquimedes, entre outras descobertas científicas. A cultura alexandrina caracteriza-se, mais do que pela criação artística, pelo espírito de reflexão, de observação e de pesquisa, o que favoreceu muito o desenvolvimento das ciências naturais e exatas. Outro aspecto importante foi seu cosmopolitismo, em oposição ao caráter regional das póleis da Grécia Antiga. A problemática que estimula a produção de obras artísticas ou científicas extrapola os limites da Cidade-estado e se universaliza, adquirindo também uma finalidade mais utilitária: daí a abundância de obras de cunho didático e erudito. Enfim, após a fase maravilhosa da criação artística do período ático, surge a época da crítica e da divulgação da cultura grega, nascendo assim o Classicismo, entendido como a consciência de considerar as obras de arte do passado como modelos a serem imitados por todos. A produção cultural do período alexandrino é bastante vasta, imitando-se todas as formas artísticas do período anterior, mas poucos autores se imortalizam. Na poesia lírica, Calímaco foi o maior poeta elegíaco; na poesia bucólica, Teócrito pode ser considerado o criador do gênero; no teatro, Menandro, o pai da "comédia nova", lançou as bases da sátira dos costumes da classe média baseada no estudo psicológico de caracteres, influenciando fortemente os melhores comediógrafos posteriores (Plauto, Terêncio, Shakespeare, Molière, Goldoni).
Talvez o único gênero literário realmente novo do período alexandrino seja a ficção em prosa, o gênero que mais tarde se chamará de "romance". Como é sabido, até o século II a.C., só existia produção literária em versos, tanto que Aristóteles, no seu tratado Poética, fala apenas de "poesia" (épica, dramática, lírica e satírica). Somente após a conquista macedônica, proliferou na Grécia o gosto por uma literatura feita de relatos de viagens em regiões longínquas e fabulosas, de biografias imaginárias de homens célebres, entre os quais Alexandre o Grande foi considerado o herói protótipo pela sua coragem de enfrentar o desconhecido. Na medida em que a prosa se torna a forma mais comum de expressão literária, confinando a poesia ao uso das pessoas cultas, os temas e os heróis imortalizados pela épica e pela tragédia são objetos de novas elaborações literárias.
História, mito, lendas e personagens, consagrados pela tradição clássica, são misturados, criando-se assim narrativas híbridas em prosa. Este tipo de literatura romanesca foi bem ao encontro dos gostos da grande massa alienada da vida pública. Realmente, é sintomático o fato de o romance grego de amor e de aventura desenvolver-se em épocas de escravidão política. Quando a Grécia, durante o apogeu da época ática, gozou de um regime democrático, fundamentado nas liberdades constitucionais das póleis, os cidadãos eram chamados a fazer parte da vida pública, através do voto livre e direto, com voz ativa e passiva. Os cargos civis e militares eram atribuídos pelo merecimento pessoal e pelas eleições de classe. As atividades militares e políticas absorviam a maior parte do tempo dos gregos, pois cada qual, tendo consciência de ser membro de um patrimônio de cultos e de tradições, sentia-se na obrigação de zelar pela riqueza material e espiritual de sua terra.
A literatura, como as outras artes, era considerada uma atividade também patriótica, no sentido de que enaltecia as origens divinas e heróicas da raça (poesia épica), instruía sobre as relações entre os homens e seus deuses (poesia dramática), ensinava o cultivo dos campos (poesia didática), exaltava as vitórias esportivas (epinícios); também a comédia de Aristófanes, enquanto inquérito sobre a vida pública e sátira político-social, não deixava de desenvolver o seu papel pedagógico.Mas, com a perda da independência política, os gregos, vivendo sob sucessivos regimes imperiais estrangeiros, afastados da vida pública, perdendo qualquer ideal de pátria, racionalizando seus mitos e pragmatizando sua filosofia, convergem suas atenções e seus desejos para a vida familiar e íntima. O individualismo substitui o coletivismo. A análise da vida pública cede lugar ao estudo da vida privada. O mito, perdido o seu significado religioso, torna-se lenda e o ideal heróico da poesia épica se transforma no ideal erótico do romance. A mimese superior é suplantada pela imitação das ações ordinárias da vida cotidiana. A literatura torna-se um meio de passatempo, uma fuga da realidade insignificante, uma evasão voluntária nas "Ilhas Fortunadas" do mundo da utopia. O período alexandrino da literatura grega nos deixou cinco romances de amor e de aventura, o mais famoso sendo Dáfnis e Cloe (→ Romance grego). O que liga entre si as cinco narrativas chegadas até nós, e mais fragmentos de outros romances, constituindo um corpus romanesco, é a aproximação do tempo de composição (entre o fim do séc. I a.C. e o II d.C.), o espaço geográfico onde se desenvolvem os enredos (as cidades helenizadas do Mediterrâneo) e, sobretudo, as semelhanças de estrutura e de significação. Como a "Comédia Nova" de Menandro e a poesia elegíaca de Calímaco, assim as narrativas de amor e de aventuras espelham o mudado gosto do público e um novo ideal de vida: a afirmação amorosa entre dois seres. No novo sistema socio-cultural, centrado no homem como indivíduo, a pessoa humana procura no amor, o mais forte dos sentimentos individuais, sua realização existencial. O ideal amoroso, o casamento feliz, a riqueza material e as viagens são as aspirações fundamentais do heleno da época alexandrina. E a ficção romanesca exprime claramente essa cosmovisão, baseada numa nova paidéia. Os estudiosos chamam de "período alexandrino" a cultura helenística que vai do III ao I séc. a.C., entre a época ática e a romana.