MIMESE (a arte como "imitação", showing da vida, mimo, momo) → Farsa
Se non è vero, è bene trovato
(ditado italiano)
Do grego mimesis, o termo exprime a arte de imitar gestos e palavras de outra pessoa. Gregos e romanos cultivaram uma forma de dramaturgia chamada "Mimo" (→ Farsa). Platão foi o primeiro teórico a considerar a arte, em geral, como a imitação de uma realidade, no sentido de que estabelece uma relação de semelhança com os elementos da natureza; mas, conforme sua teoria das Idéias, o artista reproduz apenas a aparência das coisas e não sua verdade profunda. Será seu discípulo Aristóteles, que irá precisar o conceito de mimesis: a essência das coisas (as idéias), estando na esfera da realidade física, e não num mundo transcendental, é captada pelo artista mediante a operação mental da "abstração", que possibilita a apreensão do geral presente nas coisas particulares. Imitar, portanto, não é copiar a realidade, mas idealizá-la, porque a função do poeta é descobrir a beleza intemporal que está oculta nos seres efêmeros. A mimese artística, por isso, torna-se uma forma de conhecimento do mundo, que difere da filosofia apenas quanto ao meio utilizado para a percepção da verdade. O poeta (e o artista em geral) imita não somente a natureza física (a paisagem), mas também e sobretudo a natureza humana em seus aspectos interiores e exteriores. Um texto literário contém a mimese de ações (praxis), de caracteres psicológicos (ethos), de paixões humanas (pathos). O artista seleciona o material a ser imitado, depurando-o dos aspectos grosseiros e particulares e abstraindo dos elementos contingentes as idéias gerais. Com a ajuda da fantasia, cria modelos universais de beleza. O gênio criativo anônimo e coletivo dos gregos imaginou seres dotados de virtudes e vícios humanos elevados à máxima potência e os personificou nas várias divindades da mitologia pagã (→ Mito). Os deuses são configurações idealizadas das mais fortes paixões humanas: Júpiter (a autoridade), Minerva (a sabedoria), Vênus (o sexo), Apolo (luz e harmonia), Dionísio (o instinto), Marte (a guerra) etc. O gênio individual de poetas e artistas plásticos criou obras imortais de beleza universal, cujos personagens se tornaram protótipos humanos: Aquiles (o valor guerreiro), Ulisses (a astúcia), Helena (a beleza), Penélope (a fidelidade), Medéia (a vingança), Édipo (a libido), Enéias (o herói piedoso), Dido (a paixão amorosa) etc. Na Renascença, tais modelos universais de beleza foram propostos como exemplos a serem imitados. Quer dizer, o conceito de imitação transita da natureza para os autores greco-romanos, que apresentavam em suas obras uma natureza ideal e perfeita, altamente estilizada. Por isso, durante o longo período clássico da Era Moderna (→ Idade), é tido como cânone artístico fundamental a imitação dos melhores textos épicos, líricos e dramáticos, os três gêneros literários pelos quais os antigos expressaram as diversas atitudes espirituais do homem. O preceito da imitação obrigou os nossos escritores clássicos também ao uso da mitologia, embora não mais como crença religiosa, mas apenas como motivo estético, visto que as entidades míticas eram consideradas exemplos perfeitamente acabados de modelos existenciais. O imperativo da mimese atinge também o plano lingüístico. Durante a batalha que se travou na Renascença entre os latinistas e os vernaculistas, o elemento de convergência foi a imitação de um estilo culto e elegante. Na Itália, por exemplo, os que apregoavam a necessidade de se escrever na língua latina tinham Cícero como modelo estilístico e os que preferiam a língua toscana encontravam em Petrarca o modelo ideal de expressão literária. Nas artes plásticas, a moda da imitação se chamou de "Maneirismo", do étimo italiano maniera, significando "à maneira de". Seguia-se o estilo particular dos grandes gênios da arquitetura, da escultura e da pintura do séc. XVI, Leonardo, Michelangelo e Rafael, cujas obras eram imitadas por outros artistas. Os três grandes do Renascimento, pertencentes ao chamado "grupo romano", viajavam muito (especialmente devido à peste de 1522 e ao saque de Roma, acontecido em 1527), disseminando seu estilo ou sua maneira de fazer arte. A divulgação das artes visuais foi facilitada também pela invenção do processo de reprodução que colocou cópias de obras de arte ao alcance de um público cada vez maior. O ideal de beleza clássica transitava livremente de uma arte para outra. Entre o poema Arcadia, de Sannazzaro, e o quadro Parnaso, de Rafael, existe não apenas semelhança de tema: as duas obras de arte revelam-se inspiradas pelo ideal estético da Antigüidade que coloca a técnica a serviço da expressão de uma idéia. Enfim, o conceito de imitação é inerente a qualquer forma artística, visto que nada se cria a partir do nada, conforme a famosa máxima do químico francês Lavoisier. Um ditado italiano define bem a essência da arte, fundamentada na verossimilhança (→ Classicismo): se non é vero, é bene trovato ("se não é verdadeiro, é bem achado", quer dizer, convincente, bem próximo da verdade).