NOVELA (história ficcional, telenovela) → Gênero literário → Narrativa
Sua origem etimológica remonta ao termo italiano novella, ligado ao semema "novidade", indicando uma história chocante ou simplesmente interessante, contada por alguém que vinha de outro lugar. As primeiras formas literárias, que receberam o nome de novela, estão relacionadas com a instituição da Cavalaria, pois eram os cavaleiros andantes que transmitiam as notícias trazidas de outros lugares, num tempo em que não havia outro meio de comunicação. Numa mistura entre imaginação e realidade, as canções de gesta, que narravam, primeiro, em versos e, mais tarde, em prosa, as façanhas de heróis ilustres, passaram do domínio da poesia épica para o campo da novela de cavalaria. A Demanda do Santo Graal, escrita no século XII, mas centrada sobre o ciclo arturiano que remonta ao século V, é o primeiro exemplo de narrativa cavaleiresca. No século XIV, aparece a novela toscana, designando-se com esse nome coletâneas de narrativas curtas, anedóticas, geralmente de cunho satírico. Mestre nesse gênero foi o florentino Giovanni Boccaccio que, servindo-se de fontes literárias latinas (Petrônio e Apuleio) e da tradição oral popular, compôs a famosa obra Decameron que, mais do que uma novela, é uma coletânea de contos de uma licenciosidade realista. Contrariando a opinião de alguns críticos, não consideramos a novela apenas como uma história curta, um meio-termo entre o romance e o conto. A novela é um gênero literário que tem características estruturais e semânticas bem peculiares. Em primeiro lugar, a fábula novelesca não está centrada sobre uma única história ficcional. Seu enredo é composto por uma pluralidade de histórias encaixadas numa macrofábula. Trata-se de uma narrativa de estrutura "aberta", na qual é sempre possível acrescentar mais um episódio, fazer intervir mais uma personagem, deslocar a ação num outro espaço e num outro tempo. Diferentemente, o romance é uma narrativa de estrutura "fechada": a história tem começo, meio e fim bem definidos e passa-se ao redor de um protagonista, sendo que as demais personagens vivem apenas em função da caracterização desse ator principal. Em segundo lugar, enquanto o romance está voltado mais para o real, a novela se refugia no mundo da fantasia, às vezes descuidando do princípio da verossimilhança. No universo novelístico, as coisas acontecem em conformidade com a psicologia do inconsciente coletivo: a beleza triunfa sobre a feiúra, o amor sobre o ódio, a verdade sobre a mentira, enfim, o bem sobre o mal. É a idealização da vida nos moldes da literatura de massa, aproximando-se ideologicamente do conto popular. O conceito de novela, entendida como uma história prolixa, proteiforme e idealizante, está presente quer na história desse gênero literário, quer na forma moderna de novela ou de seriado de rádio ou de televisão, onde o número de capítulos varia ao sabor da audiência. Conforme o IBOPE, os episódios se esticam ou se encurtam e os atores recebem papéis mais ou menos importantes. O autor dá um fim à novela quando percebe sinais de cansaço por parte dos telespectadores. Algo parecido acontecia antigamente, quando a novela não era vista, mas ouvida ou lida. O dramaturgo Gil Vicente, na peça Auto da Lusitânia, criticava os fiéis que "se enfadam nas capelas e folgam de ouvir novelas que duram noites e dias". Também o escritor Cervantes, no seu Dom Quixote, a mais bem-acabada novela de cavalaria, testemunha o gosto popular de ouvir histórias mirabolantes. O protagonista, em suas andanças, quando pára nas tavernas, ouve dos contadores de histórias longos relatos de amor e de aventuras. Além do tema da idealização do real, são essas histórias , encaixadas na fábula principal das aventuras de Dom Quixote e Sancho Pança, que conferem à obra de Cervantes o caráter de novela. Além da novela de cavalaria, na época clássica da cultura moderna (Renascimento, Barroco e Arcadismo), aparece também a novela picaresca (Lazarillo de Tormes), a novela sentimental (História dos amores de Peregrino e Ginebra, de Hernando Díaz) e a novela bucólica (Arcádia, de Sannazzaro). A partir do romantismo, a novela passa a confundir-se com o romance. Vai ter características de novela o romance de folhetim, longas narrativas publicadas em capítulos semanais em jornais (Les mystères de Paris, de Eugène Sue) e o romance-rio, histórias cíclicas que apresentam um grande número de personagens e de episódios que se imbricam como um estuário fluvial (Em busca do tempo perdido, de Marcel Proust). Essa obra e outras como Guerra e paz, de Léon Tolstoi, Os Buddenbrook, de Tomas Mann, O Tempo e o Vento, de Érico Veríssimo, também são consideradas novelas por alguns críticos, por conter várias histórias entrelaçadas.
Para evitar oscilações terminológicas seria preferível classificar toda a narrativa ficcional de longo porte como romance, distinguindo o romance de estrutura aberta (a antiga novela) do romance de estrutura fechada, que seria o romance no sentido mais estrito. Reservaríamos, então, o nome de novela apenas à literatura de ficção produzida em séries, capítulos ou fragmentos, conforme o uso consagrado atualmente pela televisão. Com efeito, o conceito moderno de novela remete à narração de uma história imaginária, idealizadora da realidade, feita por pedaços, que nos dá a impressão de nunca acabar, renovando-se continuamente, como a vida. Essa é a função da Telenovela, que modernamente adquiriu o estatuto de gênero à parte, resultante da conjunção da Narrativa com o Drama. Uma história ficcional de amor e de aventura é representada na tela doméstica por uma média de seis meses, dividida em aproximadamente 200 capítulos, para um público espectador composto de milhões de pessoas. A partir dos anos 60, o Brasil, através da TV Globo, se especializou nesse tipo de entretenimento, superando o dramalhão mexicano. Aos poucos, foi adquirindo um kow-how todo peculiar, exportando as melhores novelas para o mundo inteiro. A novela Selva de Pedra, de Janete Clair, em 1972, conseguiu a consagração do gênero, por alcançar quase 100% dos televisores ligados no horário nobre. A telenovela deu fama a muitos diretores e atores, interagindo com o cinema e outras artes: romances foram transformados em seriados, novelas em filmes. O grande mérito da telenovela foi divulgar a cultura no meio da massa popular, especialmente através do tratamento de temas de reconstrução histórica, recriando ambientes do passado, muitas vezes relacionados com os imigrantes, que contribuíram para o nosso progresso civilizacional: as sagas de italianos, portugueses, sírio-libaneses, entre outras. E não só o passado. A novela O Rei do Gado, de Rui Barbosa, por exemplo, aborda o tema da Reforma Agrária e da invasão das terras consideradas improdutivas pelo MST (Movimento dos Sem Terra). Outros assuntos palpitantes encontram-se discutidos nas novelas televisivas: o problema do preconceito racial e da descriminação de minorias, das drogas, da violência urbana, da injustiça social, do desajuste conjugal, etc. Embora o motivo recorrente nas tramas seja o romantismo alienante, toda a construção do ambiente e dos caracteres está centrada na representação da realidade cotidiana. Daí a grande aceitação do público telespectador, pois cada qual encontra em posturas e atitudes de algum personagem um pouco de si, vendo representando em forma de arte seus prazeres e suas angústias.