MITOLOGIA greco-romana → Mito → Religião
(Tales de Mileto, primeiro filósofo do Ocidente)
No verbete Mito, estudamos sua natureza genérica, independentemente de qualquer tipo de religiosidade. Passamos agora a olhar de um modo mais peculiar a mitologia helênica, que é considerada o acervo da civilização ocidental. Sem a presença fecundante do mito greco-romano seria difícil imaginar a origem da tragédia, da música, da arte em geral. O mito grego representa o esforço de entender os arcanos da natureza, a cosmogonia do universo, a origem das paixões humanas, o motivo de usos e comportamentos do homem helênico. No frontão do templo de Apolo, em Delfos, estava escrito "conhecer-se a si mesmo", estimulando o homem a ter uma experiência mais natural do que propriamente divina. É interessante notar que a mitologia greco-romana não tem nenhum texto sagrado, como a Bíblia de judeus e cristãos, o Corão dos muçulmanos ou os Vedas do Budismo. A religião dos antigos gregos não conheceu a experiência mística das religiões orientais, nem o messianismo do Judaísmo. Ela permaneceu ligada ao mundo dos seres naturais. Quando o filósofo Tales, no séc. VI a.C., disse: "tudo está repleto de deuses", não entendeu referir-se a entidades abstratas e distantes que, num determinado momento, tivessem resolvido criar, organizar e dirigir o mundo. Ele, como Platão mais tarde, pensava num Dáimon, num espírito cósmico, na força maravilhosa da natureza, que dá forma a tudo em vista de um fim. Contrariamente ao que está escrito nas Sagradas Escrituras das religiões monoteístas, não é Deus que cria o homem, mas são os homens que inventam os deuses a sua imagem e semelhança, projetando na configuração de entidades sobrenaturais suas virtudes, seus vícios, seus desejos, seus medos. Na mitologia greco-romana não existe o conceito de pecado como tormento interior, angústia por uma culpa ancestral, que só pode ser redimida pela chegada de um Salvador.
Os mitos gregos, inventados pelo imaginário popular, depois de longa transmissão oral, a partir do séc. IX a.C., quando a Grécia começou a usar o alfabeto, se encontram registrados em obras de historiadores, filósofos, poetas trágicos, cômicos e líricos (Heródoto, Homero, Hesíodo, Ésquilo, Sófocles, Eurípides, Aristófanes, Safo, Menandro), nas epígrafes em frontais de templos, nos túmulos, em vasos, na estatuária e na pintura. A mitologia grega tem sua "história". Os mitólogos distinguem as "Divindades Primordiais", a fase primitiva ou arcaica do nascimento dos mitos, das "Divindades Olímpicas", que seria o período de ouro da produção mitológica, quando a genealogia dos vários deuses se define completamente, apresentando um núcleo principal com suas variantes, inclusive uma divindade se inter-relacionando com outra. Falando das divindades primordiais, o poeta Hesíodo, na sua Cosmogonia, que pode ser considerada o Gênesis da mitologia grega, conta que "no começo era o Caos", o espaço aberto, pura extensão ilimitada, um abismo sem fundo. Mas no "começo", a partir de quando? O que houve "antes", ninguém pode saber, pois pertence à eternidade. Ao ser humano é dado conhecer apenas o que decorre no Tempo (→ Cronos): o antes e o depois são mistérios que fogem à percepção da razão. Narra o mito que, num momento indefinido, do Caos surgiu a primeira realidade sólida, chamada de Gaia, a Terra , que, por partenogênese, deu à luz o Céu estrelado (Urano), que a cobriu toda. Do Caos, junto com a Terra, saiu também Eros, o amor universal, cuja força irresistível operou a conjunção do Céu e da Terra, fazendo com que a mãe se apaixonasse pela sua criatura. Já a tradição órfica (→ Orfeu) apresenta uma outra versão do mito cosmogônico. Existiria um Ovo primordial que, engendrado pela Noite, deu origem a Eros. Da separação do Ovo, as duas metades formaram a Terra e o Céu. Voltando à narração de Hesíodo, a mãe-Terra, a primeira forma material surgida do misterioso Caos, movida pela necessidade de ter um companheiro, sozinha, gerou o Céu. Eros, seu contemporâneo no Caos, princípio espiritual do Amor, faz Gaia unir-se ao seu primogênito. Fecundada por ele, a Terra dá à luz os Titãs (uma dúzia de filhos "normais"), os Ciclopes (monstros de um só olho) e os Hecantôquiros (gigantes de cem braços e cinqüenta cabeças). Mas a Terra, cansada de tanto parir, decide destronar o marido e pede a ajuda do filho Cronos (Saturno), o insaciável deus do Tempo. Quando Urano se aproxima da esposa para novamente fecundá-la, Cronos atira-se sobre o pai e corta-lhe a genitália. Os testículos, cheios de sêmen, caem no oceano e formam uma espuma alvíssima, da qual emerge Afrodite (Vênus), a deusa do amor e de beleza. E o Tempo começa a reinar no cosmos. Cronos, soberano absoluto do céu e da terra, une-se a Réia (Cibele), sua irmã, também ela um titã. Engendra nela uma multidão de filhos, mas, para que não acontecesse também a ele o que fizera a seu pai, devora todos ao nascerem. Até que Cibele consegue esconder um filho, que escapa à voracidade de Saturno: Zeus (Júpiter), que consegue derrotar o pai e se tornar o senhor do Olimpo. Das doze divindades olímpicas se fala em verbetes específicos, utilizando, de preferência, os nomes latinos por serem mais conhecidos na nossa cultura → Vênus → Marte etc.